Artigo - Caxiri

11 de Jan / 2022 às 23h00 | Espaço do Leitor

Em 1992, eu estava trabalhando na campanha municipal de Boa Vista (Roraima) em favor do candidato Alceste Madeira de Almeida, conhecido simplesmente por Dr. Alceste.

Era um bom médico e uma excelente pessoa. Foi deputado federal de quatro mandatos consecutivos (1991/2007) e faleceu recentemente, vítima de um acidente automobilístico. 

Dr. Alceste não queria ser candidato à prefeitura de Boa Vista porque já sabia que perderia para Tereza Jucá, a qual tinha sido eleita Deputada Federal em 1990, com 11.128 votos, enquanto ele, nessa mesma eleição, foi eleito em segundo lugar com apenas 3.451 votos. No entanto, ele não poderia escapar da indicação de seu padrinho político, o então governador Ottomar de Sousa Pinto, natural de Petrolina-PE, que foi deputado federal constituinte (1987/1990), governador de Roraima em quatro ocasiões (1979/1983 - 1991/1994 - 2004/2005 - 2006/2007) e prefeito de Boa Vista (1997/2000).  

Com o desânimo de Dr. Alceste, o meu irmão Eliseu Santos (nessa época assessor especial do Governo de Roraima) levou algumas pessoas experientes em campanhas políticas para fortalecer a equipe. Entre esses nobres profissionais estavam: Clésio Santos, Manoel Leão, Davi Lima, Glorinha (atualmente moradora da Rua Henrique Rocha), Mariza, Lauro Lacerda, Emerson Santana, Valdir Borges e Saul Mota.  

Com pouco tempo de trabalho, a equipe de Juazeiro se reuniu com o governador Ottomar para dizer que não adiantava ele continuar gastando dinheiro com o Dr. Alceste e que a campanha estava perdida. Ottomar respondeu que já sabia disso, mas, que a equipe permanecesse em Roraima e aproveitasse a estada. Deu dinheiro a todos e os chamou de conterrâneos, pensando que eram filhos de Petrolina, porque foi essa informação que Eliseu tinha passado pra ele. Se tivesse dito que eram de Juazeiro, não teriam sido contratados.      

Por determinação do governador Ottomar eu fiquei responsável pelas comunidades indígenas, as quais eu não conhecia nem sabia dos costumes. A única coisa que eu sabia era que o voto do índio é o mais caro e difícil do mundo, porque tem que ser alimentado financeiramente durante todo o tempo.  

A primeira tribo que eu visitei foi a "Aningal", atualmente pertencente ao município de Amajari. Cumprir todos os procedimentos e quando já estava deixando essa aldeia, por volta das cinco da tarde, o Pajé me entregou uma tigela cheia de uma gororoba amarelada e simplesmenteme disse: beba. Deu-me vontade de recusar, mas, cadê a coragem? Eu era uma ilha cercado de índios por todos os lados. De outra forma, eramelhorengolir essa coisa horrível, queperder os votos.  

Os índios em Roraima votam e decidem eleições, se forem manuseados da seguinte forma: No dia anterior as eleições, uma equipe comparece a tribo, compra o cacique com uma boa quantia em dinheiro (em espécie) e leva todos os índios para um lugar isolado dentro da mata. Dão comida e cachaça a noite inteira. No dia seguinte e antes do sol raiar, os levam para a seção onde irão votar (geralmente votam num mesmo local), tempo em que são instruídos em quem e como votar. Os títulos só são entregues minutos antes deles entrarem no local de votação. Depois de concluído o processo, os trazem de volta a tribo deles e lhes dão algum dinheiro e bebidas.      

Quanto ao "Caxiri" informo que é uma bebida feita a base de mandioca, fermentada e temperada com cuspes dos índios, que escarram a distância dentro dos grandes tachos de ferro. Os índios só param de cuspir quando atingem o padrão de qualidade do cacique. 

Gilberto Maciel dos Santos, juazeirense, 66 anos, escritor.

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