A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) pretendem trabalhar para modificar no Senado alguns pontos considerados problemáticos no texto da PEC dos Precatórios, aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados.
O principal esforço das entidades é para tentar retirar da proposta os valores relativos a benefícios assistenciais e previdenciários, a serem pagos pelo INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). Esses benefícios são sensíveis, segundo as entidades, porque são considerados de natureza alimentar.
Até o fim do ano, o pagamento de precatórios federais está estimado em R$ 90 bilhões pela OAB Nacional. Caso a PEC passe na votação de dois turnos do Senado, com a redação atual, o teto será fixado em R$ 40 bilhões.
A redução de cerca de R$ 50 bilhões afeta os benefícios do INSS, fruto de julgamentos judiciais nos quais a União foi derrotada. Com a mudança, os prazos para pagamento ficam mais longos.
Vice-presidente do IBDP, Diego Cherulli considera que a medida é cruel por agravar a insegurança jurídica do país e ampliar a vulnerabilidade das pessoas que obtiveram vitórias judiciais que pretendiam corrigir distorções e erros proporcionados pelo estado.
“Os valores são oriundos de atos ilícitos do estado e interpretações equivocadas de servidores, atos prejudiciais, como muitos dos que ocorrem no INSS. Pessoas que deixaram de receber direitos por ilícitos que, adiante, sofreram correção pelo Judiciário. Mas uma correção ineficaz, porque a pessoa não sabe se vai receber ou quando”, diz o especialista em previdência.
Cherulli avalia ainda que, os pagamentos não são indenizações, mas “um direito não pago a pessoas que ficaram anos à espera dele, passando por diversos tipos de privações”.
Presidente da Comissão Nacional de Precatórios da OAB Nacional, Eduardo Gouvêa destaca que, pela nova regra, os recursos de natureza alimentar não têm mais preferência, mesmo aqueles que seriam destinados a idosos e pessoas com doença de natureza grave.
Os valores que estão em primeiro lugar na fila passam a ser relativos ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb), que terão prioridade absoluta.
Gouvêa afirma que a votação do texto na Câmara dos Deputados foi contaminada por muitos fatores externos. “Virou a PEC da Miscelânea, porque o que menos se tratou na discussão dela foi sobre precatórios. Entrou refis para municípios, desvinculação de receitas, tudo. Muitos assuntos que sequer precisariam de uma PEC para que fossem tratados”, diz.
A proposta aprovada na Casa viola pelo menos 15 disposições constitucionais, afirma o especialista. “Temos certeza de que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (União Brasil-MG), que é advogado, será sensível a isto”, afirma Gouvêa.
Caso a proposta seja aprovada pela casa revisora e vá para sanção do presidente Jair Bolsonaro, a entidade promete impetrar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ao lado de outras organizações para evitar que a medida seja implementada. Ele diz aguardar que, no Senado, a proposta tramite com mais tranquilidade. “Na Câmara, tudo correu de forma muito apressada e sem o devido debate”, conclui Gouvêa.
Cherulli, do IBDP, aponta ainda outros dois temas que causam preocupação: a demora no pagamento dos precatórios tende a aquecer a comercialização dos títulos. Sem previsão sobre quando receberiam os recursos, as pessoas se veriam impelidas a vender os créditos para garantir o recebimento ao menos de uma parcela de seus direitos.
“A gente entra em um buraco de especulações e quem ganha é quem tem mais recursos para especular com a compra de títulos dos mais vulneráveis”, diz o vice-presidente do IBDP.
O outro ponto é a insegurança sobre um direito que incide sobre a alimentação para garantir o Auxílio Brasil em 2022, o substituto do Bolsa Família, também de caráter alimentar. O programa está em vigor por meio de uma Medida Provisória publicada em 10 de agosto, mas que precisa ser aprovada em até 120 dias pelo Congresso Nacional para prorrogação até dezembro de 2022.
No aspecto de programas sociais, é um contrassenso total, fragilizar um direito alimentar em detrimento do outro. “Os dados mostram que isso não é necessário. E o Auxílio Brasil tem previsão de valer por um ano, é transitório, enquanto direitos permanentes de pessoas que contribuíram e financiaram o regime previdenciário podem ficar no marasmo e ter seus direitos negados”, conclui o vice-presidente do IBDP.
Para ser aprovada no Senado, a proposta precisa receber a adesão de três quintos dos parlamentares, nos dois turnos. Isso seria equivalente a 49 dos 81 senadores que compõem a casa revisora. Ainda não há data prevista para que a proposta seja votada.
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