Rosa Weber dá 24 horas para Câmara explicar votação da PEC dos Precatórios

06 de Nov / 2021 às 16h00 | Política

A ministra Rosa Weber, relatora no Supremo Tribunal Federal (STF) da ação que pede a anulação da votação da PEC dos Precatórios, estabeleceu prazo de 24 horas para a Câmara dos Deputados prestar informações sobre a aprovação do texto.

Um grupo de deputados entrou com uma ação no STF para contestar o rito adotado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), durante a votação em primeiro turno da proposta, que foi aprovada na última quinta-feira (4) por 312 votos - quatro a mais que o necessário.

A PEC é a principal aposta do governo para viabilizar o pagamento do Auxílio Brasil no valor de R$ 400 – o programa social irá substituir o Bolsa Família. Ela livra o governo da obrigação de pagar uma parte dos precatórios prevista para 2022, o que, na prática, libera recursos no Orçamento para serem gastos com o Auxílio Brasil.

Precatórios são dívidas reconhecidas pela Justiça.

Manobra

Para os deputados que movem a ação, o governo só conseguiu o apoio necessário para aprovar a PEC em primeiro turno porque Lira adotou manobras irregulares na votação. Eles apontam duas principais irregularidades:

votaram deputados que não estavam presentes na Câmara;
foi votada uma emenda aglutinativa que não atendia aos critérios do regimento interno (entenda mais abaixo)

No despacho, Weber sustenta que, “considerada a alta relevância do tema”, assinou o prazo de 24 horas “às autoridades impetradas, a fim de, querendo, prestem as informações que reputarem pertinentes, antes do exame do pedido de medida liminar”.

Em entrevistas, o presidente da Câmara tem negado irregularidades durante a votação.

Voto remoto
Os deputados questionam na ação a votação remota de parlamentares que estavam em missão oficial na COP 26, conferência mundial do clima realizada em Glasgow, na Escócia.

Os deputados argumentam que, de acordo com o regimento interno da Câmara, o parlamentar que desempenhar missão oficial em caráter diplomático ou cultural deve se licenciar, e, por isso, não pode votar matérias analisadas em plenário.

“(...) Com o exclusivo escopo de assegurar a aprovação da matéria ontem [quarta-feira] pelo plenário, foi baixado o Ato da Mesa n° 212, de 03 de novembro de 2021, que permitiu a votação remota de parlamentares em missão oficial para a COP26, em Glasgow, na Escócia”, diz o documento.

“De forma casuística e em patente desvio de finalidade, foi editado ato para garantir o quórum necessário à aprovação da emenda aglutinativa”, afirmam os deputados.

Os deputados afirmam ainda que tentaram obter a lista de parlamentares que estavam em missão oficial na COP 26 para saber quem votou a favor da PEC dos Precatórios, mas não conseguiram a relação de nomes.

"Com certeza mais do que dez parlamentares estavam licenciados, em missão diplomática em Glasgow, o que já é suficiente para considerar rejeitada a emenda aglutinativa, que foi aprovada por apertada maioria, 312 dos 308 necessários. Subtraídos os votos dos parlamentares licenciados, chegar-se-ia, pelo menos, a 302 Deputados, o que acarretaria a rejeição da matéria”, argumentam.

Emenda aglutinativa

A emenda aglutinativa substitutiva é o texto final que foi levado à votação. Tem esse nome porque reúne todas as emendas (sugestões de alterações) que foram apresentadas à proposta ao longo da tramitação.

Só que os deputados alegam que a emenda aglutinativa foi apresentada antes do registro das outras emendas que lhe serviram de base.

Na ação ao STF, os deputados alegam que a emenda aglutinativa foi apresentada às 21h05, enquanto as emendas que dariam suporte às mudanças foram apresentadas às 21h55.

De acordo com os parlamentares, a manobra fere os princípios regimentais e a Constituição.

"Para dar causa à emenda aglutinativa, a emenda de redação, no mínimo, deveria lhe ter precedido, o que sequer ocorreu", escrevem os deputados.

Os deputados argumentam ainda que as emendas que justificariam alterações no texto principal da PEC, na forma de uma emenda aglutinativa, deveriam ter sido apresentadas durante a tramitação da PEC na comissão especial que discutiu a matéria.

No caso da PEC dos Precatórios, quatro emendas foram apresentadas a tempo, na comissão especial, mas nenhum delas obteve o número necessário de assinaturas.

OAB também contesta

Em nota técnica divulgada neste sábado (6), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) apontou para inconstitucionalidades e irregularidades na PEC dos Precatórios e também questionou os ritos adotados durante a votação do texto.

Segundo a OAB, a proposta representa a “sexta tentativa de calote” no pagamento dos precatórios e prevê alterações já declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal durante julgamento de outras PECs que trataram sobre o tema.

Em parecer assinado pelo presidente Felipe Santa Cruz, há questionamentos à taxa de correção para o pagamento e a avaliação de que a proposta “representa verdadeira ofensa à separação dos poderes” e de que houve irregularidades no rito da votação.

“Como se nota por todo o exposto, a PEC 23/2021, seja em seu texto original, seja no substitutivo aprovado pela Câmara dos Deputados em votação de primeiro turno, mostra-se flagrantemente inconstitucional por violar a separação dos poderes, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, bem como por se mostrar contrária à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que, em diferentes ocasiões, declarou a inconstitucionalidade do parcelamento de precatórios e a sua correção monetária por meio da taxa Selic”, afirma Santa Cruz no documento.

“A par disso, e por fim, destacamos que para além das inúmeras inconstitucionalidades de ordem material aqui apresentadas, houve também na votação da PEC pela Câmara irregularidade em seu rito, o que já foi questionado no STF. Discute-se também acerca da emenda aglutinativa, uma vez que esta foi apresentada às 21h05, enquanto as emendas que dariam suporte às mudanças foram apresentadas às 21h55. Ou seja, o texto final levado à votação foi apresentado antes mesmo que estivesse de fato finalizado”, acrescenta.

G1 / foto: reprodução

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