Às vésperas das manifestações do 7 de Setembro, o presidente Jair Bolsonaro repetiu neste sábado (4) em Caruaru (PE) ameaças golpistas, falou numa "ruptura que nem eu nem o povo deseja" e defendeu que ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) sejam "enquadrados" pela população.
Mais uma vez sem citar os nomes, mencionando apenas "um ou dois" ministros, os ataques foram direcionados a Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, esse último também presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
"O STF não pode ser diferente do Poder Executivo ou Legislativo. Se tem alguém que ousa continuar agindo fora das quatro linhas da Constituição, o poder tem que chamar aquela pessoa e enquadrá-la. Se assim não ocorrer, qualquer um dos três Poderes... A tendência é acontecer uma ruptura", afirmou.
"Ruptura essa que eu não quero nem desejo. Tenho certeza, nem o povo brasileiro assim o quer. Mas a responsabilidade cabe a cada poder. Apelo a esse poder, que reveja a ação dessa pessoa que está prejudicando o destino do Brasil", discursou diante de centenas de apoiadores.
Bolsonaro afirmou que as imagens das manifestações de seus apoiadores convocadas por ele serão "a marca do que o povo deseja". "Enquanto juristas ficam procurando quem é o poder moderador do Brasil, eu digo a todos eles: o poder moderador é o povo brasileiro", afirmou.
"Temos um ou outro saindo da normalidade. Temos um ou dois jogando fora das quatro linhas da Constituição. Nós jogamos dentro das quatro linhas. Mas o povo, como poder moderador, não pode admitir que nenhum de nós jogue fora dessas quatro linhas", declarou.
O presidente falou a apoiadores no estacionamento do polo comercial de Caruaru.
O local foi o ponto final de uma motociata de cerca de 60 km iniciada perto das 9h em Santa Cruz do Capibaribe -único município pernambucano em que o presidente venceu nos primeiro e segundo turno da eleição de 2018- e que passou por Toritama até Caruaru, cidades do agreste pernambucano.
Desde a chegada até o discurso, trajeto no qual cumprimentou de perto apoiadores, o presidente não usou máscara de proteção contra a Covid-19. Estava acompanhado de ministros e do pastor Silas Malafaia, que tem sido um dos principais porta-vozes nas críticas ao STF.
Bolsonaro se prepara para participar de protestos de raiz golpista e de pautas autoritárias em seu favor que estão marcados para o feriado de 7 de Setembro na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e na avenida Paulista, em São Paulo. Bolsonaro prometeu comparecer e discursar nos dois atos.
Como o próprio Bolsonaro já disse, ele busca nesses protestos uma foto ao lado de milhares de apoiadores para ganhar fôlego em meio a uma crise institucional provocada por ele mesmo, além das crises sanitária, econômica e social no país.
Isolado, Bolsonaro perde apoio nas classes política e empresarial, além de aparecer distante do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em diferentes pesquisas de opinião sobre as eleições de 2022.
Na sexta-feira (3), em Tanhuaçu, sudoese baiano, o presidente afirmou que as manifestações da próxima terça-feira (7) servirão como um ultimato a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).
Sem citar nomes, o presidente disse que não faz críticas a instituições ou Poderes, mas sim críticas pontuais a pessoas. Os ataques são a Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, esse último também presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
"Nós não criticamos instituições ou Poderes. Somos pontuais. Não podemos admitir que uma ou duas pessoas que usando da força do poder queiram dar novo rumo ao nosso país", afirmou.
"Essas uma ou duas pessoas têm que entender o seu lugar. E o recado de vocês, povo brasileiro, nas ruas, na próxima terça-feira, dia 7, será um ultimato para essas duas pessoas", disse o presidente.
"Curvem-se à Constituição, respeitem a nossa liberdade, entendam que vocês dois estão no caminho errado porque sempre dá tempo para se redimir", prosseguiu.
Na última terça-feira (31), em Uberlândia (MG), Bolsonaro afirmou que a população brasileira nunca teve uma oportunidade como a que terá com os atos do próximo dia 7 de Setembro. O presidente, porém, não deu detalhes sobre qual seria essa oportunidade e para fazer o que exatamente no feriado.
Já nesta quinta-feira (2) os presidentes do Supremo Tribunal Federal e do Congresso mandaram alertas para rechaçar condutas autoritárias, e Bolsonaro disse que o Brasil "está em paz" e não precisa temer as manifestações.
Bolsonaro respondeu, em tom irônico, ao presidente do STF, Luiz Fux, que afirmou que o tribunal estará "vigilante" no feriado da Independência e que "liberdade de expressão não abrange violência e ameaça".
Mais cedo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse que "não se negocia a democracia" e que qualquer "intervenção ou autoritarismo [...] tem que ser rechaçado".
Não é de hoje que o presidente flerta com o golpismo ou faz declarações contrárias à democracia. Como governante, ele mantém este tipo de discurso.
"Alguns acham que eu posso fazer tudo. Se tudo tivesse que depender de mim, não seria este o regime que nós estaríamos vivendo. E apesar de tudo eu represento a democracia no Brasil", afirmou em uma formatura de cadetes em fevereiro deste ano.
Em 2020, Bolsonaro participou de manifestações que defendiam a intervenção militar. No passado, em uma entrevista em 1999 quando ainda era deputado, Bolsonaro disse expressamente que, se fosse presidente, fecharia o Congresso.
Hoje, por um lado, há incerteza quanto a se Bolsonaro teria ou não apoio suficiente para ser bem-sucedido em eventual tentativa de se manter no poder ao arrepio da lei.
Por outro lado, torna-se cada vez mais próxima da unanimidade a avaliação de que é preciso levar a sério o risco de que, em um cenário desfavorável, ele saia da retórica e chegue às vias de fato.
O presidente usa e abusa de retórica golpista como forma de manter o fantasma vivo, e se apresenta como um corpo único com os militares. A realidade é bem mais complexa.
Não há pilares para um golpe clássico, como alinhamento entre as três Forças e parte significativa da sociedade civil, seja para tirar Bolsonaro, seja para transformá-lo num ditador. Há uma compreensão clara de que isso não seria digerido pelas elites, pela população e no exterior.
Bolsonaro claramente sonha com isso, e um roteiro de ruptura foi desenhado por seu ídolo Donald Trump, que viu hordas de apoiadores invadirem o Congresso para tentar impedir a validação da eleição de Joe Biden em 6 de janeiro.
Toda a defesa de que eleição sem voto impresso é fraude busca criar um arcabouço para, na visão dos mais pessimistas, forçar uma situação de conflito nas ruas caso Bolsonaro derreta de vez e seja derrotado nas urnas em 2022.
Isso levaria a impasses, como a decretação de uso de força federal ou mesmo estado de defesa em alguns locais. Há dúvidas se Bolsonaro iria atender a pedidos de ajuda de governadores opositores, por exemplo, o que levaria a crise para o Judiciário.
Comandantes são unânimes em dizer, durante conversas reservadas, que não há espaço para golpismos, mas o fato é que não houve nenhum teste de realidade sobre isso para atestar tal comprometimento.
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