Entre 93% e 95% das espécies de plantas e animais vertebrados da Amazônia sofreram impactos do fogo nas últimas duas décadas. É o que diz um estudo publicado nesta quarta-feira (1º) na Nature, uma das principais revistas científicas do mundo.
Assinam o trabalho pesquisadores da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, e brasileiros da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
A pesquisa cruzou dados de satélite de áreas da Amazônia atingidas por incêndios com as áreas de ocorrência de 11.514 espécies de plantas e 3.079 de animais vertebrados. Com isso, foi possível quantificar o impacto do fogo na biodiversidade da região.
Desde 2001, entre 103 mil e 190 mil quilômetros quadrados de floresta foram atingidos pelas chamas. Para algumas espécies, isso representou mais de 60% da área de ocorrência comprometida.
Espécies ameaçadas
O fogo é especialmente delicado a espécies listadas como ameaçadas pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), filiada à Unesco.
Segundo o estudo, 90% das espécies de plantas e animais vertebrados ameaçados da Amazônia (ou 472 de 520) tiveram a área de ocorrência impactada pelo fogo. A consequência direta é a redução da área de circulação dessas populações, que podem se tornar disfuncionais bem antes de perder a totalidade do habitat.
É uma realidade cumulativa ao longo dos anos que ainda pode ser pior do que os números mostram. Afinal, o conhecimento sobre a distribuição de biodiversidade na Amazônia ainda é limitado pela inacessibilidade da região, os dados de satélite tendem a subestimar os focos de incêndio e os vertebrados são parte bem reduzida do reino animal.
Dados de biodiversidade da Amazônia
40% das florestas tropicais remanescentes no mundo estão na Amazônia
10% de todas as espécies conhecidas no mundo estão na Amazônia
1.000 espécies de árvore a cada km² de Floresta Amazônica
Os ciclos de incêndio na Amazônia
O estudo também constatou o resultado de políticas ambientais nos ciclos de fogo na Amazônia.
Até 2008, incêndios eram mais frequentes e impactavam áreas maiores. Entre 2009 e 2018, excetuando os anos de seca, políticas ajudaram a reduzir as taxas de incêndio. Em 2019, com o relaxamento de políticas, o impacto do fogo nos primeiros oito meses foi maior do que o esperado.
Os números só melhoraram nos últimos quatro meses do ano após pressão social e, então, esforço do governo para combater focos.
No início de 2020, o governo criou o Conselho da Amazônia e instalou operações das Forças Armadas para proteção do bioma. Mesmo assim, índices de desmatamento e incêndio seguiram batendo recordes.
Segundo o estudo, em 2019, o fogo chegou a regiões mais internas da Amazônia, onde não é costume. Se seguir esta tendência, o impacto ali pode ser maior, já que as áreas guardam um maior número de espécies.
O impacto do desmatamento
A Amazônia é caracterizada pelo clima úmido. Portanto, os incêndios naturais são raros. A maior parte dos incêndios é causada por ação humana, especialmente aquelas associadas ao desmatamento. A prática oferece mais material inflamável, afeta o ciclo de chuvas e abre novas frentes para o avanço do fogo.
Estimativas apontam que, com uma perda de 25% de cobertura vegetal, a Amazônia pode entrar em um processo de savanização. O termo se refere ao ponto em que a redução vegetal e alta da temperatura se tornaria inviável para uma floresta úmida. Hoje, 20% da cobertura vegetal da Amazônia já foi perdida.
Até o momento, a riqueza da biodiversidade ajudou a contornar os efeitos da crise climática no mundo. No entanto, desmatamento e incêndio associados podem aumentar a frequência, intensidade e extensão das secas na Amazônia. Com isso, a regeneração da floresta fica dificultada, e os ciclos futuros de destruição e impacto piores.
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