Na véspera do fim do prazo, a Câmara dos Deputados aprovou nesta segunda-feira o texto principal da medida provisória (MP) que viabiliza a privatização da Eletrobras.
Ainda é necessário votar algumas propostas de alteração no projeto antes da análise ser encerrada pelo Congresso. A proposta já foi aprovada no Senado e na própria Câmara, numa primeira votação. O texto principal da MP foi aprovado por 258 votos a favor e 136 contra.
Após a conclusão da votação pela Câmara, o texto seguirá para sanção do presidente Jair Bolsonaro. A votação da MP da Eletrobras é uma vitória para a agenda do ministro da Economia, Paulo Guedes, que tenta avançar na sua primeira grande privatização. As vendas de estatais, até agora, estiveram focadas em subsidiárias de empresas. Se a MP não fosse votada até esta terça-feira, ela perderia a validade.
A Câmara manteve a maior parte das alterações na MP aprovadas pelo Senado. Como era uma segunda votação da Câmara, cabia à Casa apenas analisar as mudanças feitas pelos senadores e não era possível voltar ao texto original do governo. Foram os próprios deputados que começaram a incluir exigências na MP, o que foi reforçado pelos senadores.
O relator da Câmara, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), fez três modificações principais em relação ao texto aprovado pelo Senado. A primeira delas foi a retirada de uma indenização de R$ 260,4 milhões ao governo do Piauí pela privatização da distribuidora de energia do estado.
Ele também retirou a abertura do mercado livre de energia, ponto que fora elogiado pelo setor e por especialistas. O texto do Senado permitia que, a partir de julho de 2026, todos os consumidores pudessem optar pela compra de energia elétrica de qualquer concessionário, permissionário ou autorizado. Isso foi rejeitado pela Câmara.
Por último, Nascimento não concordou com a forma como os contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) serão renovados. O Senado estabeleceu a renovação pelo preço médio dessas fontes, de acordo com o último leilão, enquanto a Câmara colocou a renovação por um preço mais alto. O governo chegou a classificar a proposta da Câmara como uma "bomba".
Para garantir a primeira grande privatização de uma estatal, o governo aceitou muitas mudanças no texto que afetam desde a política ambiental até o planejamento do setor elétrico e a manutenção de funcionários da Eletrobras em outras estatais.
Especialistas afirmam que a privatização da Eletrobras é essencial para fazer frente aos investimentos necessários no setor elétrico. Mas avaliam que as mudanças incluídas no Congresso podem ter tornado a conta muito alta, com repasse de custo bilionário ao consumidor e ações que afetam a competitividade de empresas.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) rejeitou classificar as mudanças como jabutis (elementos estranhos à proposta original):
— A medida provisória vem falando de energia. A gente dizer que uma matéria de pertinente com energia é jabuti é depreciar o trabalho de deputados e deputadas, que têm total respaldo para fazer emendas.
Pelo texto, mantido pela Câmara, o governo precisará “contratar” 8 mil megawatts (MW) de energia gerada por usinas termelétricas a gás natural. Para isso, será necessário fazer um leilão de energia em que vence quem oferecer a menor tarifa.
Será preciso construir termelétricas nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste. A maioria das localidades onde as térmicas serão instaladas não conta com reservas de gás ou infraestrutura de transporte, o que representará custo bilionário na construção de gasodutos. Críticos do projeto destacam que não cabe ao Congresso definir cidades onde devem ser construídas termelétricas e dizem que isso é um incentivo à ineficiência.
O texto prevê outros 2 mil MW de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). A crítica, nesse caso, é de criação de uma reserva de mercado e interferências no planejamento do setor.
A Câmara também manteve a mudança feita no Senado que tira poder do Ibama e da Funai no licenciamento ambiental da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista. O empreendimento foi leiloado em 2011 e sua previsão era de entrar em funcionamento em 2015, mas as obras não começaram.
A polêmica gira em torno da passagem do linhão pelas terras do povo indígena Waimiri-Atroari. O texto estabelece que "uma vez concluído o Plano Básico Ambiental-Componente Indígena (PBA-CI), traduzido na língua originária e apresentado aos indígenas, fica a União autorizada a iniciar as obras" da linha de transmissão. Na prática, haveria dispensa da aprovação pela Funai e pelo Ibama, responsáveis pela análise do licenciamento ambiental.
O governo ganhará menos com a privatização que o previsto. A previsão é levantar mais de R$ 60 bilhões. Mas o relatório muda a destinação de parte do dinheiro. Metade irá para as políticas sociais do setor elétrico. Mais R$ 9 bilhões para a revitalização de bacias hidrográficas. E o restante (cerca de R$ 20 bilhões) para o governo. Antes, eram R$ 25 bilhões.
A Eletrobras privada precisará pagar pela revitalização das bacias hidrográficas do Rio São Francisco, do Rio Parnaíba, dos rios administrados por Furnas (em Minas Gerais e em Goiás) e na região da Amazônia Legal (especialmente o Rio Madeira).
O texto proíbe mudanças nas sedes da Eletrobras, incluindo Furnas, Eletronorte, Eletrosul e Chesf, num prazo de dez anos após a privatização. A empresa deverá realocar qualquer população que esteja morando abaixo de linhas de transmissão de grande capacidade. Pelo texto, empregados da Eletrobras demitidos nos 12 meses subsequentes à privatização poderão ser realocados em outras estatais. A tendência é que isso seja vetado, já que seria inconstitucional permitir o ingresso em estatais sem um concurso para o fim específico do cargo.
A Eletrobras será privatizada por meio de um aumento de capital na Bolsa de Valores. O governo não irá acompanhar essa capitalização e, por isso, terá sua participação reduzida de 60% para cerca de 40%. Mesmo assim, deve ser o principal acionista da empresa.
A estatal se transformará numa corporação sem controle definido. Nenhum acionista ou bloco de acionista terá poder de voto superior a 10% do total, mesmo que tenha uma participação acionária maior que isso.
O relator Marcos Rogério (DEM-RO) manteve no texto final a exigência de construir termelétricas a gás natural em redutos eleitorais. A maioria deles não conta com infraestrutura de transporte de gás, o que exigirá gastos bilionários para obras de gasodutos.
O principal ponto de insatisfação do governo, porém, foi excluído do projeto: a necessidade de contratar estas usinas antes de vender a Eletrobras.
O governo considerava o prazo inviável pois pretende concluir a operação até o primeiro trimestre de 2022. Ainda assim, será necessário contratar por meio de leilão 8 mil megawatts (MW) de usinas nas regiões Centro-Oeste, Nordeste, Norte e Sudeste. A Câmara havia aprovado a contratação de 6 mil MW. O Senado ampliou o volume de energia.
O relator exige que o Executivo elabore plano para viabilizar a recuperação de reservatórios de hidrelétricas do país — o que atende à demanda do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), sobre o lago de Furnas, em Minas Gerais.
A Eletrobras também deverá realocar toda e qualquer população que esteja morando abaixo de linhas de transmissão de grande capacidade.
Funcionários demitidos sem justa causa durante os 12 meses subsequentes à desestatização deverão ser aproveitados em outras estatais. Para integrantes do governo, isso deve ser vetado.
O relator propôs estender até 2035 o apoio a termelétricas a carvão, atendendo empresas do segmento e a bancada de Santa Catarina. A fonte de energia, mais poluente, está sendo deixada de lado no mundo todo. Diante da repercussão, o relator retirou esse incentivo no texto final.
O projeto dispensa as aprovações da Funai e do Ibama, responsáveis pela análise do licenciamento ambiental, para a construção do linhão Manaus-Boa Vista, que passa sobre uma terra indígena.
A linha de transmissão irá ligar Roraima ao Sistema Interligado Nacional. O empreendimento foi leiloado em 2011 e sua previsão era de entrar em funcionamento em 2015, mas até hoje as obras não começaram.
O governo ganhará menos com a privatização que o previsto. A previsão é que a capitalização da empresa levante mais de R$ 60 bilhões. Mas o relatório muda a destinação de parte do dinheiro. Metade será para políticas sociais no setor elétrico.
Mais R$ 9 bilhões vão para a revitalização de bacias hidrográficas. E o restante (cerca de R$ 20 bilhões) para o governo. Antes, eram R$ 25 bilhões.
O relatório muda a forma de nomeação da diretoria do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Agora, os nomes terão que passar pelo crivo do Senado. O ONS é responsável pela coordenação e controle da operação das instalações de geração e transmissão de energia no país.
O relator exige que o Executivo elabore plano para viabilizar a recuperação de reservatórios de hidrelétricas do país — o que atende à demanda do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), sobre o lago de Furnas, em Minas Gerais.
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