Um Projeto de Lei (PL) que tramita há seis anos na Câmara dos Deputados está prestes a ser o mais novo ponto de polêmica sobre políticas para o Rio São Francisco no Congresso Nacional. Trata-se do PL 3941/2015, que propõe a criação do chamado Fundo de Revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e dá outras providências.
O texto sugere que esse fundo seja formado a partir de 1% de todo o valor da energia elétrica produzida na bacia do rio a ser paga por concessão ou autorização do seu potencial hidráulico, bem como percentuais de operações de crédito internas e externas firmadas por entidades públicas e privadas e dotações da União.
Além de mexer em pontos complicados, como valores e legislações referentes à distribuição de energia elétrica do País, na prática o texto altera programas de financiamento já existentes nos ministérios de Desenvolvimento Regional e do Meio Ambiente que, ao menos teoricamente, já beneficiam o São Francisco. Fará com que as destinações de recursos desses projetos sejam cessadas ou remanejadas, a partir do que for decidido entre os parlamentares, por conta do fundo.
A matéria também pode vir a dar ainda mais poder à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), que tende a ser, caso seja aprovada, a estatal responsável pela operacionalização desse fundo.
Com tramitação retirada de pauta várias vezes, tendo sido alvo de dois pareceres pela sua rejeição anteriormente, o projeto foi objeto de três reuniões, de maio até agora, entre deputados que integram a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara. No final de maio, foi designado um novo relator no colegiado para apreciar a matéria, o deputado Daniel Coelho (Cidadania-PE).
O Fundo de Revitalização da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco foi proposto ao Congresso a partir de um projeto de autoria do deputado Leônidas Cristino (PDT-CE), com o intuito de destinar mais recursos para programas e projetos voltados para a recuperação ambiental da cobertura vegetal das margens do rio e seus afluentes. A sugestão de Cristino é voltada para promoção de ações de sustentabilidade dos recursos hídricos da bacia hidrográfica.
Conforme esse texto inicial, durante os primeiros dez anos, os recursos desse fundo serão destinados, exclusivamente, para a cobertura vegetal nas margens do rio. O deputado justificou sua proposta dizendo que essas ações são “inadiáveis”, principalmente a recuperação das matas ciliares e da cobertura vegetal de toda a margem dos rios da bacia. “Sobretudo para garantia de sua vazão”, destacou na justificativa do projeto.
Segundo Cristino, embora haja determinação constitucional de participação dos Estados, do Distrito Federal e de municípios no resultado da exploração de recursos hídricos para a produção de energia elétrica, ou de compensação financeira por essa exploração, não existe obrigação legal para que esses recursos sejam usados especificamente para o financiamento da recuperação da cobertura vegetal das margens e encostas das bacias hidrográficas do São Francisco.
Em 2019 o então deputado Reinhold Stephanes Junior (PSD-PR) apresentou um relatório contrário à proposta, no âmbito da comissão. Ele argumentou seu trabalho dizendo que existe um programa específico para a revitalização da bacia hidrográfica do rio em execução, desde o ano 2000 no Ministério do Meio Ambiente e que tal programa recebe recursos da União, com o mesmo fim.
O parlamentar destacou, também, que os municípios afetados por hidrelétricas já são contemplados com a chamada Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos – CFURH, que destina 6,25% do valor da energia produzida aos Estados, Municípios e órgãos da administração direta da União e que a Codevasf – estatal que é vinculada ao Ministério de Desenvolvimento Regional – promove várias atividades pertinentes às ações pedidas na matéria.
O assunto ficou parado na comissão porque muitos parlamentares nordestinos acharam melhor aguardar um momento oportuno para avaliar a matéria e agora decidiram pela reapreciação do projeto, uma vez que o parecer de Stephanes não chegou a ser votado.
Alguns integrantes do colegiado avaliam também que o momento é de preocupações com o abastecimento dos reservatórios de hidrelétricas do Brasil. Em abril, o País terminou o seu período chuvoso com um dos menores níveis dos reservatórios da região Sudeste/Centro-Oeste, a principal em termos de geração hidráulica de energia desde 2015. E o Rio São Francisco tem exportado energia para outras regiões com mais intensidade, desde 2019.
A matéria terá tramitação bem observada por muitos líderes partidários que temem ver a criação do fundo como uma nova forma de se beneficiar deputados do Centrão – bloco político que tem dado apoio ao governo Jair Bolsonaro no Congresso – com mais recursos, a partir do pretexto de viabilização de novas ações voltadas para a preservação do São Francisco.
De acordo com informações de técnicos da comissão que organizam o plano de trabalhos, o novo relator pretende ouvir parlamentares, especialistas e técnicos do Governo Federal para avaliar a questão. Além da situação da bacia em si, o colegiado quer saber também como está sendo a execução dos programas voltados para revitalização, se houve paralisação desses trabalhos e se foram recursos cortados no Orçamento da União deste ano para tais ações.
Apesar do período de pandemia, no qual a Câmara tem trabalhado de forma híbrida – presencial e remotamente – a previsão é de que as audiências públicas sejam iniciadas a partir do segundo semestre.
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