Imensa contradição parece instalar-se na sociedade contemporânea a propósito do Dia das Mães. Por um lado, há um culto, uma aclamação, um entusiasmo por esse dia festivo, entoado enfaticamente pelo comércio e pela mídia. Será ele, porém, por outro lado, de fato endossado por certa parte do movimento feminista, aquela mais ostensiva e mais exaltada? Ou essa parte, na verdade detesta o Dia das Mães porque, em última análise, rejeita a maternidade?
E esse é o problema nuclear que embaraça certo feminismo: definir com clareza a relação entre a mulher e a maternidade. O que pensa ele da maternidade? Considera-a a plena realização da mulher, ou acidente e, pior, um estorvo, a ser evitado?
Assim como não são iguais o homem e a mulher (o que não significa que um seja melhor do que o outro), maternidade e paternidade são realidades humanas profundamente diferentes. Por mais que o pai ame o filho, sua relação com ele nunca é igual à relação da mãe. A da mãe com o filho é uma relação mais do que afetiva, é uma relação vital, biológica mesmo. A sensação que a criancinha tem, sobretudo nos anos iniciais, de pertencer à mãe, até de ser mais do que uma continuação dela, confundir-se com ela (da qual a lenta consciência da existência de um terceiro, o pai, vai ajudá-la a se livrar aos poucos), é uma espécie de contrapartida da sensação que a mãe tem, de que o filho é sua continuação real, é ela mesma, seu corpo mesmo, vivendo além. Não é pouca coisa manter e nutrir um filho dentro de si por nove meses, senti-lo desenvolvendo-se dentro de seu próprio organismo – e nenhum pai compreenderá isso plenamente.
Houve, evidentemente, notável avanço civilizacional quanto à condição feminina – pelo menos no nosso mundo ocidental: terem as mulheres se emancipado, não só conseguirem o direito de votar mas poderem educar-se, chegar inclusive às universidades, entrar no mercado de trabalho, disputar lugares com os homens. Era de terrível inferioridade a condição antiga em que a mulher era apenas destinada ao casamento sem se instruir e sem trabalhar, ficando frustrada e meio marginalizada se não casasse, e sendo totalmente dependente, primeiro, do pai e depois do marido, cujos maus tratos teria de suportar até por não ter condições de subsistir por conta própria. Ter libertado a mulher dessas opressões é grande mérito da civilização moderna.
Mas quando vem a maternidade? Quando, formada e bem colocada no mercado de trabalho, ela se torna mãe? Como conciliar as exigências de uma e outra situações? Ou bem a mulher e a sociedade, priorizarão a condição de profissional, relegando a maternidade (e virão as creches, para criar os pequeninos sem o amor, o carinho, a presença materna) ou priorizarão a condição materna e subordinarão o trabalho profissional ao “Dia das Mães”.
O que a mulher-mãe quer para si mesma? E o que a sociedade quer quanto à formação das futuras gerações? Qual o custo maior – o das creches ou dobrar o salário das mulheres-mães para que trabalhem apenas um expediente e fiquem em casa, no outro, criando seus filhos? Não só o custo financeiro, mas também o custo social. O que representará para as futuras gerações serem criadas por terceiros, em creches profissionais, ou no aconchego da mãe, cujo empenho pessoal na boa formação de seus rebentos jamais será substituído a contento por outrem?
José Luiz Delgado-Professor de Direito da UFPE
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