Pelo menos 43 mil dos 700 mil infectados por coronavírus na Bahia, em um ano de pandemia, são profissionais de saúde. A enfermeira Karine Queiroz atua em um Posto de Saúde da Família (PSF) de Feira de Santana, município a cerca de 100 km de Salvador, onde foi registrado o primeiro caso de coronavírus na Bahia.
Ela admite que nos últimos dias tem sido difícil manter o controle emocional diante do aumento dos casos da doença. "É um desgaste físico e mental muito grande para a gente. Tenho medo pela minha família, meus amigos, meus colegas. Conheço de perto essa doença e sei quão devastadora ela pode ser."
Karine detalha que entre outubro e dezembro, não fazia mais do que três testes para detecção de Covid-19 na unidade onde trabalha. A partir de janeiro, no entanto, a demanda cresceu e atingiu o pico no final de fevereiro deste ano. Desde então, são feitos pelo menos 20 testes diariamente no local, com grande índice de positivos, segundo ela.
"Infelizmente, o que noto é que as pessoas não estão se cuidando como é necessário e muitas vezes quem não sai adoece por quem sai".
O sentimento dela diante da situação é de impotência.
"A única forma que tenho de mudar a realidade é através do meu trabalho, mas não tem sido suficiente e isso me entristece. A população está banalizando a doença e não acredita na gravidade porque números não se transformam em nomes. Só que quando a doença vem, não lhe dá nem o direito nem de se despedir das pessoas. Feira de Santana está de um jeito que só vaga leito se morrer alguém. Esse nome no atestado de óbito pode ser o meu e o seu".
A enfermeira teve coronavírus em junho de 2020, com sintomas fortes, como diarreia, dor no pulmão e indisposição. O filho e o marido, que é asmático, também contraíram a doença, sem gravidade. "Agora estou vacinada, mas temo pelos meus. Não sei quando todos terão essa mesma oportunidade".
Mesmo imunizada, Karine mantém os cuidados necessários em tempos de pandemia. "Saio pouco, só para ir na igreja e na academia, porque é o que me deixa menos ansiosa. Esses dias nem estou me exercitando, com medo". Com a rotina resumida ao trabalho e à própria casa, ela começa a sentir novamente um forte stress.
"Não tenho um colega que nesse momento não precise de um suporte psicológico. Eu me amparo na fé, mas o desgaste é grande, porque ninguém cuida de quem cuida. Estamos todos exaustos".
Manuela Veiga, enfermeira que atua na UTI de um hospital particular de Salvador, também se queixa da sobrecarga em tempos de pandemia. Na opinião dela, a vacina para a categoria traz um alívio, porém, não resolve o problema maior, que é a resistência às medidas sanitárias.
"Tem gente que vê tudo fechando e reclama, mas não sabe o que o aumento dos casos de Covid gera. É um drama. É muita morte, muito sofrimento, e isso nos traz não só um cansaço físico, mas também mental. Temos medo de perder colegas, pessoas queridas, medo de adoecer de novo, isso nos desestabiliza", desabafa.
Manuela teve Covid em abril de 2020. Como algumas colegas já estavam doentes, ela desconfiou que poderia ter contraído, pois começou a apresentar sintomas como dores no corpo e calafrios. Procurou atendimento médico, fez teste e deu positivo. O quadro piorou e ela teve episódios de vômito e febre, além de perder paladar e olfato. Depois, não teve sequelas.
Antes mesmo de adoecer, a enfemeira já tinha adotado medidas para tentar impedir que outras pessoas com quem mora fossem contaminadas. "Quando surgiu o primeiro caso de Covid, comecei a aumentar a higienização, não fazia mais refeições na mesa, evitava estar no mesmo ambiente das outras pessoas. Se não fosse por isso, talvez tivesse acontecido algo pior em casa".
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