Carnavalizando

13 de Feb / 2021 às 23h00 | Espaço do Leitor

Não é mania dizer que bom era o carnaval de antigamente em Juazeiro da Bahia muito menos nostalgia ou saudosismo. É uma constatação mesmo! As festas carnavalescas  eram esperadas e programadas dentro de uma expectativa empolgante. O preciosismo na escolha das fantasias era o "abre-alas", o cartão de visitas, porque era preciso estar a caráter para as folias de Momo.

Lança-perfume, o desfile das batucadas, dos ranchos, as serpentinas e os confetes... Os bailes, as bandas entoando marchinhas, especialmente compostas para a ocasião. Coisa alguma se passava aleatoriamente. Arlequins, pierrôs e colombinas eram, entre outros, personagens cativos e, literalmente, "se brincava o carnaval".

Eu também já posso me dar ao luxo de falar dos carnavais de minha infância, meio século passado. As ruas ganhavam uma movimentação impressionante com os blocos dos sujos, dos indios, dos caretas. Nos clubes, os bailes promovidos nos salões, das matinês aos bailes noturnos, não havia na vizinhança quem reclamasse do barulho.

Entretanto, em minha rua  o carnaval começava bem antes, com os preparativos das fantasias que as mulheres costuravam prazerosamente. A máquina Singer ziguezagueava pela noite adentro e jamais vi ou senti alguém  estressada, reclamando disso ou daquilo. Talvez porque não fosse moda dizer "tô morta!". Muito vivaz, só lhes restavam o sossego das altas horas noturnas para costurar as ideias carnavalescas e foram muitos os modelos que criaram com seus caprichos de mulheres prendadas. Do mais puro cetim aos materiais de acabamento, era tudo um luxo só! E ao mesmo tempo, era tão simples. Parece que o glamour vinha justamente da boa vontade de se dispor a costurar depois de uma longa jornada operária.

Alguns guris eram incumbidos de uma única tarefa: experimentar as fantasias sem reclamar dos alfinetes espetando. Era o máximo que nos cobrava. No dia da festa, Era chique ir ao retratista, entrar no estúdio, sentar num tamborete aveludado, cruzar as mãos sobre os joelhos e sorrir. Sorria-se naturalmente, porque tudo era encantamento. Tudo fascinava os nossos olhinhos e a emoção de sermos holandeses, soldadinhos, piratas e o que mais mamãe inventasse.
Serpentinas, confetes e espirradeiras não faltavam.

A Rua D' apolo era um verdadeiro sambódromo e a alegria, a grande apoteose. Mascarados, "batifun" de latas, apitos, estalinhos e tudo o mais que pudesse divertir sem qualquer perigo para os foliões tinha apenas um cordão de isolamento formava a passarela para o desfile dos sonhos de uma cidade. Era o carnaval do "Vai quem quer" e todo mundo queria mesmo brincar... Mas, como brincadeira tem hora, quando passava o trio elétrico de Urbano patrocinado pela prefeitura com produção de "Seu Santinho "aí, sim, sem pena nem dó  de amassar a fantasia, o mundo se transformava, o cansaço era dominado pelo frenesi dos encantos daquela farra assustadora que chamavam de folis de momo até altas horas.

Quando chegava quarta-feira, de cinzas as marchinhas silenciavam em respeito à Quaresma. Chorava o tamborim! Era o fim do carnaval. Hoje, diante da pandemia é só tristeza.

Valterlino Pimentel

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