Uma das características mais marcantes do coronavírus é a infecção do sistema respiratório. É aí que que e faz necessário o oxigênio hospitalar.
É do ar que a gente respira que vem a matéria prima da vida que faltou em Manaus. Quando estamos saudáveis, os 21% de oxigênio existentes no ar são suficientes para manter o corpo funcionando. Pulmões doentes exigem muito mais e é de um processo industrial que se extrai o oxigênio puro.
O ar captado da atmosfera é filtrado, comprimido e resfriado. Depois é purificado com a retirada de contaminantes. Em seguida, numa torre de destilação, os gases nitrogênio, argônio e o oxigênio são separados. O oxigênio resfriado ganha forma líquida ou gasosa e é armazenado em tanques que serão depois transportados em cilindros ou em caminhões especiais porque o risco de combustão, de fogo ou explosão são altos.
“Agora, com essa situação de emergência, está sendo que ser transportado por avião e existe uma limitação de capacidade. Esses tanques são pesados, eles têm capacidade limitada de oxigênio. Então é um problema logístico bastante complicado de resolver”, explica Reinaldo Bazito, professor do Instituto de Química da USP.
Cinco empresas produzem oxigênio medicinal no Brasil. Uma, em Jundiaí, vem aumentando a produção para atender a 350 hospitais brasileiros.
A White Martins, a maior delas e que fornece para Manaus, informou que em 100 anos de atividade nunca viu situação igual. O consumo na capital do Amazonas, que era de 12.500 metros cúbicos por dia, entre janeiro e março de 2020, alcançou 30 mil metros cúbicos entre abril e maio, na primeira onda da Covid, e agora, em apenas 15 dias, atingiu 70 mil metros cúbicos por dia - quase três vezes a capacidade de produção da empresa na cidade.
“É uma situação de tragédia, me senti terrível ontem quando vi aquelas cenas. Isso precisaria ter sido planejado com antecedência, é algo que foi sendo avisado pelos especialistas ao longo do tempo. Infelizmente aconteceu, agora é resolver. Mas a gente vê de maneira assim, desesperadora, e claro, pode acontecer em outros lugares se não for feito planejamento adequado”, afirma Reinaldo Bazito.
Para aumentar a capacidade de produção, a White Martins pediu a redução de 99% para 95% na concentração de oxigênio medicinal produzida na Região Norte. A Anvisa concordou com a mudança por 180 dias.
A concentração não interfere na pureza. O professor de química lembra que o ar tem só 21% de oxigênio, e era esse ar que profissionais de Manaus heroicamente tentaram usar quando faltou oxigênio.
“Eles estão usando ar em vez de oxigênio. Ventilar manualmente, ele está soprando ar no ventilador do paciente. Isso tem 1/5 da concentração do oxigênio que tem oxigênio puro. A efetividade disso é muito pequena, é heróico, eles estão tentando resolver, mas é terível. Não tem substituto para o oxigênio puto nessa situação”, diz Reinaldo Bazito.
E esse oxigênio medicinal não e essencial apenas para manter vivos os doentes de Covid. Nas incubadoras dos bebês prematuros, nas cirurgias que necessitam de anestesia, para complementar inalação de medicamentos, o oxigênio é fundamental nos hospitais.
O médico que atende pacientes graves em São Paulo explica que usando cateter, máscaras ou entubação, pacientes podem precisar de quantidades que variam de 2 a cerca 50 litros de oxigênio por minuto. Um cilindro comum de oxigênio pressurizado tem 50 litros, o que seria inviável em certos casos.
“O consumo pode ser bastante alto, depende da gravidade do caso, e ele precisa ser contínuo, não pode... Uma interrupção de poucos minutos pode comprometer a evolução e o prognóstico do paciente. Sem uma taxa de oxigênio adequada circulando no organismo, rapidamente as células, os órgãos, passam a comprometer a sua função, passa a poder haver morte celular e a evolução torna o quadro irreversível. Imagino o sofrimento, a angustia, o desespero que nossos colegas estão passando na região Norte”, diz Leonardo Rolim, diretor do Hospital Moises Deutsch e da Rede Einstein.
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