Em queda há cinco anos, as coberturas vacinais não atingem nenhuma meta no calendário infantil desde 2018, apresentou hoje (16) a coordenadora-geral do Programa Nacional de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde, Francieli Fontana, que informou dados do início de outubro na Jornada Nacional de Imunizações.
As últimas metas de imunização para o público infantil atingidas no país, em 2018, foram de 99,72% do público-alvo para a BCG, e de 91,33% para o da vacina contra o rotavírus humano. Para ambas, a meta é superar os 90%, patamar que não foi atingido em 2019, apesar de terem continuado acima dos 80%. Já até 2 de outubro de 2020, a taxa de imunização do público-alvo da BCG chegou a 63,88%, e a vacina contra o rotavírus, a 68,46%.
A maior cobertura atingida no calendário infantil até outubro de 2020 foi na vacina Pneumocócica, com 71,98%. No ano passado, essa mesma vacina chegou a 88,59% do público-alvo. Entre as 15 vacinas do calendário infantil, o que inclui a segunda dose da Tríplice Viral, metade não bate as metas desde 2015, o que inclui a vacina contra poliomielite.
"Esse é um dado bastante importante, que preocupa muito o Ministério da Saúde e deve preocupar todos os profissionais de saúde para que a gente una esforços e trabalhe para ampliar essas coberturas vacinais", disse Francieli Fontana, que avalia que a pandemia da covid-19 deve ter influenciado as coberturas vacinais. "A gente ainda não tem uma avaliação real do impacto da pandemia nas coberturas vacinais, mas acredita-se que, sim, vamos ter prejuízos em relação à cobertura vacinal devido a esse momento".
Francieli Fontana explicou que a queda nas coberturas vacinais durante a pandemia foi um fenômeno sentido globalmente. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 125 campanhas de vacinação que estavam marcadas para o primeiro semestre de 2020 foram adiadas. O problema da interrupção dos serviços de vacinação levou a OMS e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) a alertarem que 117 milhões de crianças em 37 países poderiam deixar de receber a vacina contra o sarampo, que também provocou surtos em diversas partes do mundo nos últimos anos, incluindo o Brasil.
A queda nas coberturas desafia o Programa Nacional de Imunizações do Sistema Único de Saúde, considerado um dos mais amplos e bem sucedidos do mundo. O programa teve um aumento expressivo nas taxas de vacinação entre 1980 e 1995, ano a partir do qual as taxas ficaram estáveis em patamares elevados, e, em alguns casos, superiores a 100%. O recuo teve início em 2015, e, antes da pandemia, já pesavam fatores como horários de funcionamento das unidades de saúde, a circulação de informações falsas sobre a segurança das vacinas e até mesmo a impressão de que as doenças imunopreveníveis já deixaram de existir.
"Se tivemos sucesso, é porque tínhamos coberturas vacinais altas. A partir do momento que passamos a ter uma cobertura vacinal baixa, pode haver uma reintrodução de doenças que já foram eliminadas", alerta Francieli Fontana, que cita o exemplo do sarampo, que chegou a ser considerado erradicado do Brasil e hoje apresenta transmissão ativa em quatro estados e casos em 21.
A coordenadora do PNI também destaca a necessidade de engajamento e capacitação do profissionais de saúde, para transmitirem informações corretas à população. "A gente verifica muitas fake news, muitas notícias falsas, e, muitas vezes, o profissional de saúde, em vez de buscar uma fonte segura e se empoderar em relação ao conhecimento, ele multiplica essa notícia. É importante que a gente busque informação fidedigna, para que a gente possa ter segurança em orientar a população".
Entre as ações do Ministério da Saúde para combater a queda das coberturas vacinais está o Movimento Vacina Brasil, que inclui iniciativas como a ampliação do horário de funcionamento dos postos de vacinação e um canal de telefone e Whatsapp para desmentir notícias falsas, no número 61 99289-4640. Também estão em andamento três campanhas de vacinação: uma contra o sarampo, desde março, e as campanhas contra a poliomielite e de multivacinação, desde 5 de outubro. Amanhã (17), para o Dia D, postos de vacinação em todo o Brasil estarão abertos para aplicar as doses, tirar dúvidas e atualizar as carteirinhas.
Diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, o infectologista Guido Levi lembra que cumprir o calendário de vacinação é uma obrigação dos cidadãos prevista em lei desde a criação do Programa Nacional de Imunizações, na década de 70. "Estamos vendo a responsabilidade social, não mais a responsabilidade individual. É o indivíduo como membro da sociedade. É uma situação diferente da sua autonomia para tratar um glaucoma ou uma doença não contagiosa", afirma ele, que cita estudos que atribuem às vacinas um aumento de cerca de 30 anos na expectativa de vida global ao longo do Século 20.
Apesar de instrumentos legais como o Estatuto de Criança e do Adolescente preverem a possibilidade de acionar o Conselho Tutelar em caso de recusa à vacinação por parte dos responsáveis por uma criança, Levi afirma que o diálogo com informações claras deve ser o principal instrumento de profissionais da saúde e da educação que se depararem com cadernetas de vacinação incompletas.
"O conselho tutelar é uma última instância. A primeira instância é informação, informação e informação. Quando uma criança vem à escola com a carteirinha incompleta, deve-se chamar os pais e responsáveis, conversar com eles. É muito importante a conversa olho no olho, porque sabemos que os profissionais de saúde tem um alto nível de confiabilidade no nosso país", afirmou. "Se fizermos tudo isso, tenho certeza que a maioria dos pais e responsáveis vai pôr em dia a vacinação das crianças".
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