Apesar do apelo da classe artística, a Câmara dos Deputados aprovou o regime de urgência para a tramitação do Projeto de Lei 3968/97, que suspende o pagamento de direito autorais para órgãos públicos e entidades filantrópicas.
Nos últimos dias, artistas, músicos e compositores fizeram uma forte campanha nas redes sociais para mobilizar a opinião pública e tentar impedir que o PL fosse votado em regime de urgência, já que estamos no meio da maior "angústia vivida pela saúde pública mundial", como definiu Gilberto Gil em artigo publicado sobre o assunto no jornal "Folha de S. Paulo" do último domingo.
Uma carta pública assinada por mais de 30 entidades - entre elas sociedades de gestão coletiva, associações de classe, grupos representantes da música e da cultura e até entidades internacionais - foi enviada para os deputados com críticas severas ao projeto de lei, mas o requerimento de urgência foi aprovado ontem por ampla maioria de votos: foram 350 a favor, 19 contra e 3 abstenções. Com isso, a PL 3968/97 terá prioridade na pauta do plenário; em outras palavras, urgência regimental, embora ainda não haja qualquer previsão de quando o PL será votado.
Entre os que votaram contra o requerimento, está a deputada carioca pelo PCdoB Jandira Feghali. Em sua alegação, a deputada afirmou que "não é justo retirar direitos dos artistas, principalmente agora que eles foram fortemente atingidos pela pandemia do coronavírus, sem poder fazer shows". O deputado Pedro Bezerra do PTB afirmou "É momento de nos unirmos. Tudo que vier a enfraquecer ou prejudicar nossa produção cultural deve ser combatido". Muitos deputados votaram pelo "acordo", mas "sem entrar no mérito". Mas o que isso quer dizer?
Através das medidas provisórias 907 e 948 – ambas desenhadas para fomentar o turismo e diminuir as perdas dessa indústria por conta da pandemia –, houve uma tentativa recente de permitir que o setor hoteleiro deixasse de pagar os direitos autorais pela execução pública das obras musicais em quartos de hotéis. Ao setor hoteleiro, uniram-se vários outros atores do mercado, como rádios comunitárias e igrejas, todos com o mesmo objetivo: não pagar pelo uso de obras musicais. Sendo assim, quando se vota pelo "acordo", mas sem "entrar no mérito", significa que os deputados estão cumprindo o que combinaram quando deixaram de fora das MPS as emendas relacionadas aos direitos autorais relacionadas. Contudo, eles não garantem um voto, mais à frente, que efetivamente implemente as isenções.
O PL que isenta o pagamento ao ECAD - Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - de direitos autorais pelo uso de obras musicais e litero-musicais está tramitando na Câmara desde 1997. A pauta da sessão virtual foi conduzida presencialmente pelo presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O que é um Projeto de Lei?
Um PL é um projeto de lei que pode ser apresentado por qualquer deputado ou senador, comissão da Câmara, do Senado ou do Congresso, pelo presidente da República, pelo procurador-geral da República, pelo Supremo Tribunal Federal, por tribunais superiores e cidadãos. Na maioria das vezes, um PL começa a tramitar na Câmara, à exceção dos apresentados por senadores, que começam no Senado. O Senado funciona como "casa revisora" para os projetos iniciados na Câmara, e vice-versa. Se o projeto da Câmara for alterado no Senado, volta para a Câmara. Da mesma forma, se um projeto do Senado for alterado pelos deputados, volta para o Senado. A casa onde o projeto se iniciou dá a palavra final sobre seu conteúdo, podendo aceitar ou não as alterações feitas.
Do que trata especificamente o PL 3968/97?
PL 3968/97 (e apensados): isenta órgãos públicos e entidades filantrópicas do pagamento de direitos autorais pela execução de músicas. Há articulações na Câmara para incluir os hotéis entre os isentos de pagar os direitos autorais. A urgência foi pedida pelo deputado Newton Cardoso Jr (MDB-MG) e outros parlamentares.
O que é um projeto apensado?
A apensação é um instrumento que permite a tramitação (andamento do processo) conjunta de proposições que tratam de assuntos iguais ou semelhantes. Quando uma proposta apresentada é semelhante a outra que já está tramitando, a Câmara determina que a mais recente seja apensada à mais antiga. Resumindo: são projetos de lei que abordam assuntos semelhantes e tramitam em conjunto. Isso evita contradições e desperdício de tempo do Congresso Nacional.
O que é "regime de urgência"?
É o tipo de encaminhamento das proposições determinado pelo tempo que tramitam nas diversas comissões. O regime de urgência dispensa algumas formalidades regimentais. É como se ele (o projeto) "furasse uma fila" e entrasse na frente de outros projetos que estão em trâmite no Plenário. Para tramitar neste regime, a proposição deve tratar de matéria que envolva a defesa da sociedade democrática e das liberdades fundamentais; tratar-se de providência para atender a calamidade pública; de Declaração de Guerra, Estado de Defesa, Estado de Sítio ou Intervenção Federal nos estados; acordos internacionais e fixação dos efetivos das Forças Armadas, entre outros casos. Uma proposição também pode tramitar com urgência, quando houver apresentação de requerimento nesse sentido. Caso a urgência seja aprovada, a proposição será colocada na Ordem do Dia da sessão deliberativa seguinte, mesmo que seja no mesmo dia. Porém isso não significa que ela será votada. Significa apenas que o projeto está pronto para ser votado mas isso depende de acordos entre os parlamentares.
Quando o PL 3968/97 deve ser votada? Não existe ainda uma previsão de quando o PL será votado.
Se na votação do PL 3968/97, o SIM tiver maioria dos votos, quanto o setor musical deve perder?
Ainda não é possível prever o impacto dessa perda, porque não se sabe o que será votado. Porém, isentar órgãos públicos que promovem festas populares como carnaval, réveillon, festas de peão e outros grandes eventos, entidades filantrópicas (PL 3968/1997) e quartos da rede hoteleira e cabines individuais de navios ou trens (PL 3992/2020) de pagar direitos autorais certamente causará um prejuízo muito significativo ao setor. Especula-se que o rombo possa chegar a R$ 100 milhões em arrecadação de direitos autorais.
Quais são os próximos passos? A primeira coisa a se fazer é tentar esticar o máximo possível o prazo de votação, para que a matéria seja discutida amplamente através de audiências públicas e outros debates. Se entrar em votação, é preciso conhecer o texto para tentar retirar os pontos prejudiciais ao setor artístico, de modo que eles não prevaleçam e sejam rejeitados. Se acontecer de esse projeto passar na Câmara, ele ainda vai ao Senado e, depois, à sanção do presidente da República.
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