Quando o Presidente da República carece de uma base parlamentar sólida, o Congresso torna-se dominante no processo político nacional. Foi assim com o segundo mandato de Dilma, com Temer e agora com Bolsonaro. E quando o parlamento é fragmentado, não há um partido capaz de levar o trabalho sozinho, surge uma frente suprapartidária com uma miríade de partidos para formar maioria e determinar o conteúdo das decisões nacionais.
Essa frente no Brasil é o Centrão. Sua proeminência na política nacional vem se dando sobre os últimos três presidentes, todos desprovidos de coalizões de apoio disciplinadas, ainda que por razões distintas. Fato que não ocorreu durante os mandatos de Fernando Henrique, Lula e Dilma I, presidentes que governaram por coalizão, com apoio popular e controle sobre a agenda parlamentar.
A partir do segundo governo Dilma, se estabelece um relacionamento precário do Executivo com os líderes dos partidos aliados na Câmara dos Deputados. O ponto de virada da força parlamentar sobre o governo foi a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, em 2015, e o ápice foi a votação do impeachment, em abril de 2016.
Por suas próprias mãos, Dilma perdeu o apoio parlamentar do qual desfrutara no primeiro mandato, por conta de erro de cálculo na eleição da presidência da Câmara, mas também pela perda do apoio popular que se deu no interior da mudança de política econômica. Dilma perdeu a maioria por falhas de coordenação política e por perda de apoio popular. O Centrão então ditou o tom das decisões nacionais durante 2015 e depois a impediu em 2016.
Michel Temer, um dos artífices do impeachment, teve um governo com apoio sólido na Câmara, suficiente para somar os votos para livrá-lo de duas denúncias por organização criminosa e obstrução de justiça na Câmara dos Deputados. Entretanto, as gravações de conversas com Joesley Batista e o agravamento da crise econômica jogaram a avaliação positiva do governo em incríveis 3%.
Como o Centrão o apoiou com esse patamar? Aqui houve uma convergência de interesses: Temer e o Centrão compartilhavam de preferências quanto ao enfraquecimento da Lava-Jato. Como as denúncias da Procuradoria Geral da República minavam o seu respaldo popular, o presidente cedeu o controle do executivo para o Centrão em troca da conclusão do seu mandato. Por origem e por necessidade, a agenda de Temer foi a agenda da mediana do parlamento. E essa mediana é o Centrão.
No governo de Jair Bolsonaro a força do Centrão tem causas diferentes. Nasce da decisão presidencial de não montar base de apoio partidária e procurar governar pela barganha com as bancadas temáticas, especialmente a do agronegócio, a da flexibilização do porte de armas das igrejas evangélicas. Entretanto, em 2019, as decisões relevantes foram ditadas pelo Centrão, que atuou como fiel da balança para a agenda substantiva do executivo, como a reforma da previdência, o pacote anti-crime e os esforços para liberalização do porte de arma. O mesmo ocorreu agora, nas decisões econômicas emergenciais durante a pandemia, foi o Congresso, Centrão à frente, que atuou para determinar o conteúdo das medidas.
A aproximação de Bolsonaro em direção ao Centrão, desde abril último, para a qual a saída de Sérgio Moro do governo foi parte fundamental, não parece reordenar a dinâmica entre o presidente e o Centrão para aprovação da agenda bolsonarista. Antes, parece funcionar como um escudo contra as possíveis tentativas de impeachment. O governo foi derrotado em todos os pontos da PEC do Fundef, mas conseguiu fazer o impeachment sumir da agenda política. Esses casos demonstram como o Centrão de Bolsonaro tem um caráter defensivo e não afirmativo.
Luiz Domingos Costa e André Frota são professores e integram o Observatório de Conjuntura do Grupo Uninter
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