A determinação do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), para que seja convertido em “reclamação” o pedido de liminar do Congresso Nacional para evitar a venda de refinarias da Petrobrás sem autorização legislativa, pode atrasar ainda mais o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.624.
Ajuizada pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT), a ADI questiona a venda de estatais sem permissão do Legislativo.
“Além das refinarias da Petrobras, que estão sendo colocadas à venda por esse governo privatista, outras estatais, como a Caixa, estão ameaçadas”, alerta o presidente da Fenae, Sérgio Takemoto. “O presidente do banco [Pedro Guimarães] já anunciou que, ainda este ano, começa a vender ativos da Caixa. Não podemos permitir que o patrimônio público continue sendo entregue aos interesses privados”, acrescenta. Estão na mira da agenda de privatizações, a Caixa Seguridade (prevista para ocorrer no próximo mês de setembro), a área de cartões e o setor de Gestão de Fundos do banco, além das loterias.
Com o despacho de Lewandowski, passam a ter duas ações tramitando no STF com o mesmo fim: os embargos de declaração na ADI — apresentados pela Fenae e a Contraf em dezembro de 2019 — e a "reclamação" do Congresso. “Nossa expectativa era que, com o questionamento feito pelas presidências do Senado e da Câmara a respeito da venda de subsidiárias da Petrobras, houvesse uma manifestação mais célere por parte do STF”, analisa Takemoto.
BRECHA — Ao julgar a ação da Fenae e da Contraf/CUT, em junho do ano passado, o STF decidiu que o governo federal não pode vender empresas estatais sem o aval do Congresso. Mas, o Supremo liberou a negociação das subsidiárias dessas empresas públicas sem licitação ou autorização do Legislativo.
A brecha passou a ser usada pelo governo federal que, inclusive, começou a criar subsidiárias com o objetivo de privatizá-las sem passar pela Câmara e o Senado. Já prevendo a utilização desse tipo de manobra por parte do governo, as assessorias jurídicas da Fenae e da Contraf/CUT ingressaram com embargos declaratórios para que fosse explicitado que o procedimento é inconstitucional.
“O STF poderia ter protegido o patrimônio público. Era o que esperávamos quando entramos com a ADI contra a Lei de Estatais. Hoje, a maioria das empresas públicas funciona com as subsidiárias”, ressalta o presidente da Fenae.
LIMINAR — As mesas do Senado e da Câmara dos Deputados entraram, no início do mês de julho, com pedido de liminar no STF para impedir a venda pela Petrobrás de suas refinarias. Os presidentes das duas Casas alegaram que a medida iria contra a decisão da própria Corte, segundo a qual é necessário aval do Congresso para a venda de ativos de uma empresa-matriz.
De acordo com as Casas legislativas, a Petrobras pretende alienar seu patrimônio estratégico a partir da criação de novas subsidiárias, de modo a permitir que a decisão tomada pelo STF seja "fraudada", por meio de expedientes que permitam "a venda disfarçada e simulada de ativos". O Senado e Câmara, então, solicitaram uma nova e imediata manifestação do STF.
No despacho, o ministro Lewandowski explica que “a alegação de descumprimento de decisão proferida em ação de controle concentrado de constitucionalidade é matéria complexa, que deve ser debatida no instrumento adequado — a "reclamação" — meio próprio para preservar a competência e a garantia da autoridade das decisões do STF”. Lewandowski também determinou que a "reclamação" seja enviada à Presidência do Supremo para distribuição (designação de relator).
NOTA PÚBLICA — No último dia 17, a Fenae e a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT) divulgaram nota pública em que defendiam que o Supremo Tribunal Federal incluísse a Câmara dos Deputados e o Senado como partes interessadas na ADI 5.624, que questiona as privatizações. “A entrada das duas Casas neste processo é importante não apenas para manter as prerrogativas do Congresso Nacional mas também para a preservação do patrimônio público, que vem sendo dilapidado sob a lógica de redução da atuação do Estado na esfera econômica e sua atuação em segmentos estratégicos, como os setores bancário, petrolífero e de energia”, observavam a Fenae e a Contraf.
Na nota, as entidades alertavam para os prejuízos que o país terá com a venda de empresas públicas que são vitais para o desenvolvimento econômico e social do país; principalmente, durante a crise provocada pela covid-19. “O governo tem mostrado que não vai parar com o projeto de privatização nem durante a pandemia, quando a presença do Estado é imprescindível para retomar a economia no período pós-crise", destacou o presidente da Fenae. "Pelo contrário: usam subterfúgios para dividir as empresas e privatizá-las aos pedaços, como estão fazendo com a Caixa Econômica Federal”, emendou Sérgio Takemoto.
SUBTERFÚGIOS — A ADI 5.624, que questiona dispositivos da Lei das Estatais (13.303/2016), foi impetrada pela Fenae e a Contraf em novembro de 2016. O STF decidiu que o governo federal precisa consultar o Congresso antes de vender as chamadas "estatais empresas-matrizes"; mas, pode privatizar as subsidiárias sem autorização do Legislativo.
Essa determinação, no entanto, vem sendo burlada. A Fenae e a Contraf denunciam que governo está usando subterfúgios para fatiar empresas públicas e vender ativos delas sem permissão.
A entrada da Câmara e do Senado como partes interessadas no processo foi solicitada ao Supremo pelo presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), após receber denúncia do senador Jean Paul Prates (PT-RN) de que a Petrobrás estaria criando subsidiárias para vender ativos da empresa sem autorização do Legislativo. No centro da questão está a abertura de processo para a venda de oito das 13 refinarias da empresa, mantendo apenas as unidades do Rio de Janeiro e de São Paulo.
O alerta da Fenae é para evitar que o governo faça com a Caixa Econômica o que vem fazendo com a Petrobrás, que já foi a quarta maior empresa do mundo (2010). Desde 2015, diferentes subsidiárias foram vendidas, como as empresas de gasodutos Transportadora Associada de Gás (TAG) e a Nova Transportadora do Sudeste (NTS), além das petroquímicas Suape e Citepe. Os governos também passaram o controle da BR Distribuidora para mercado, vendendo 62,5% das ações da empresa.
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