Próximo à meia-noite, em meio a fogos de artifício, os versos de Luiz Gonzaga e José Fernandes recitados por Elba Ramalho decretam a abertura oficial da maior festa da cultura brasileira.
Sob os acordes da sanfona e em uníssono com a multidão do Pátio do Forró em Caruaru, todos os olhos literalmente se voltam para o alto a contemplar “o balão multicor que lá no céu vai sumindo” e no “país” Pernambuco os trinta dias que se seguem é (seria) de arrasta-pé, xote e baião.
Mas neste 2020 as “ruas enfeitadas, o velho carregando bacamarte e os mais de vinte palhoções” não vão ser vistos em Caruaru, tampouco a cantora e compositora paraibana vai subir ao palco na “Capital do Forró”, quebrando uma tradição de mais de três décadas.
Diante da pandemia do novo coronavírus, a não realização dos festejos juninos pelas bandas de cá é mais um dos efeitos trazidos pela doença que alterou padrões e reinventou realidades. “O sentimento é de tristeza por mais esta consequência da doença, mas não havia outra alternativa”, pontua Elba, em conversa com a Folha.
Ao menos quinze shows estavam marcados para o ciclo, um deles em mais uma abertura no São João na cidade do Agreste do Estado e em Campina Grande (PB). Mas Elba se mantém resignada e encara o fato de não ter a festa como “situação excepcional e necessária”, enaltecendo que, no momento, os lamentos devem se voltar aos enfermos e às vidas perdidas.
“Desde o primeiro dia do isolamento estou rezando o terço da misericórdia e pedindo saúde a todos. O mundo mudou, nós mudamos e a festa também. Há mais de 40 anos, junho é um período de trabalho intenso e já cheguei a fazer 25 shows na temporada", conta.
Adepta das lives, que para o período é opção para forrozar, Elba não acredita que tão logo surja, por exemplo, uma vacina para o vírus, o fole da sanfona tem que voltar a roncar nas ruas. “É uma alternativa e representam um papel importante. O meu canto vai chegar mais longe e alcançar multidões maiores, mas assim que surgir uma vacina o povo vai querer dançar bem agarradinho no meio da praça”, profetiza ela, que neste Santo Antonio, fez sua estreia nas transmissões ao vivo e volta nos dias 19 e 23 através do seu canal no YouTube, sugerindo que “as famílias abram espaço na sala, afastem os móveis e caiam no forró" junto com ela.
“Antes de tudo nordestino é um forte”, gaba-se Elba, 68 anos, ao falar do momento atual e dedicar em mensagem ao povo pernambucano que tudo isso “vai passar e vamos crescer e nos fortalecer”. Mas enquanto não passa, haja produção desta nordestina da música e que nesta quarentena tem sido especialmente “da casa e da família”.
Artisticamente, a paraibana tem adiantado o próximo disco em estúdio que mantém em casa e recentemente lançou nas plataformas o primeiro single de um disco que vai trazer o show realizado por ela, ao vivo do São João de Campina Grande em 2019.
“Forró Pesado” (Assisão e Lindolfo Barbosa, 1975) e “É Proibido Cochilar” (Antonio Barros, 1970) abrem a produção, que tem a gravadora Deck à frente. “Me Diz Amor” (Accioly Neto) e “De Mala e Cuia” (Flávio Leandro) são outras entre as dezenas que vão compor o cancioneiro cantado na festa na Paraíba.
Mas entre uma parada e outra, em seu estúdio particular, Elba também tem se dedicado a explorar sua própria casa, descrita por ela como “muito confortável e que ajuda a passar este momento com muita calma”. “Eu a redescobri e o meu jardim também. Estou valorizando muito mais o meu espaço, sempre agradecendo”, ressalta ela que, há pouco mais de um mês, ganhou a primeira neta, Esmeralda.
“A chegada no meio da pandemia foi uma bênção! É a vida que se renova, é o milagre de Deus. Estou integrada a um novo dia a dia, curtindo minhas filhas, rezando, trabalhando, assistindo lives e aprendendo”.
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