É impossível falar de Caruaru sem citar a feira, o comércio e o São João. Neste 18 de maio de 2020, o município completa 163 anos "sem" os três pilares que o tornaram conhecido nacionalmente: a feira foi suspensa em 18 de março por tempo indeterminado, o comércio de serviços não essenciais não funciona desde o dia 21 do mesmo mês e o Maior e Melhor São João do Mundo não vai ser realizado nas ruas pela primeira vez em cerca de 40 anos.
A razão para tamanha mudança é uma só: a pandemia do coronavírus. A Covid-19 infectou mais de 4,7 milhões de pessoas ao redor do mundo - sendo mais de 243 mil no Brasil, conforme mostram os dados da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos.
De acordo com o último boletim da Secretaria Estadual de Saúde (SES), Pernambuco tem 19.452 casos. Em Caruaru, a prefeitura confirma 160 pessoas infectadas.
Devido à doença, as recomendações dos médicos e especialistas para evitar o contágio são o isolamento social, sem aglomerações, e os cuidados com a higiene pessoal. No município que faz aniversário nesta segunda-feira (18), as recomendações foram cumpridas com a não realização da feira, do São João e o fechamento das lojas - que normalmente reúnem milhares de pessoas.
Para se ter uma ideia, de acordo com a Associação dos Sulanqueiros, em cada feira realizada no Parque 18 de Maio passam 30 mil pessoas. O local conta com 12 mil feirantes. E, conforme apontam os dados da prefeitura, no São João 2019, Caruaru recebeu 3,2 milhões de pessoas.
Neste aniversário diferente, no qual a Princesa do Agreste verá chegar os 163 anos "sem" o comércio, a feira e o Maior e Melhor São João do Mundo, a história não deixa mentir e ressalta a importância destes três pilares para a construção do "país" de Caruaru.
A relevância da feira e do comércio para Caruaru é tão evidente que as histórias dos três se confundem. Essa relação econômica e que, ao longo os anos, também se tornou cultural surgiu antes da Princesa do Agreste se tornar cidade, em 18 de maio de 1857.
"Segundo as fontes mais antigas, que tive oportunidade de consultar, a feira em frente à Capela de Nossa Senhora da Conceição teve início no final da década de 1780. No início da década seguinte, a feira já era importante para todos que acorriam à sede da Fazenda Caruaru para assistir a missa. Temos como data registrada para o fato 1793", informou ao G1 o historiador Josué Euzébio, que é professor, mestre em História e atual presidente do Instituto Histórico do município.
Desta forma, a Feira de Caruaru tem em torno de 227 anos de existência e "foi muito importante para a fazenda se tornar um povoado próspero", conforme destacou Josué. Em 2006, a feira foi considerada patrimônio cultural e imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Quando Caruaru se tornou povoado, casas começaram a ser construídas próximas à capela. Naquela época, as famílias moravam no primeiro andar e instalavam lojas comerciais no térreo. "Acreditamos que depois da morte de José Rodrigues de Jesus, em 1820, o povoado já demonstrava ser um grande centro comercial. A história de Caruaru nos mostra que o comércio cresceu perto da feira", ressaltou o historiador.
Ao longo dos anos, a feira cresceu, mudou de lugar e ganhou até música como homenagem. "A Feira de Caruaru", escrita por Onildo Almeida e gravada por Luiz Gonzaga, completou 63 anos no último 21 de março. Ao G1, o compositor da canção que ressalta que a feira tem "de tudo que há no mundo" revelou que esta é a maior obra dele.
Diferentemente da feira e do comércio, a história de Caruaru com o São João é mais recente. Apesar da "jovem" relação, os festejos juninos trouxeram para a Capital do Agreste a alcunha de "Capital do Forró", por meio da música homônima escrita por Jorge de Altinho.
Na explicação do professor Josué, "as tradições culturais de comemorar o dia de Santo Antônio, São João e São Pedro, vieram com o catolicismo. No Brasil é algo comum em quase todo território". Porém, no Nordeste é diferente: "Devido às condições climáticas e ambientais, formou uma nova maneira de entender e explicar o ciclo do milho, com forte apelo religioso".
Pela tradição do povo nordestino, o homem do campo procura plantar milho no dia de São José, o santo padroeiro dos trabalhadores, no dia 19 de março. A intenção é fazer a colheita três meses depois, em junho. "As festas de São João eram praticadas no meio rural. Com o êxodo no final dos anos 50, vimos no decorrer das décadas de 1960 e 1970 as ruas de Caruaru serem enfeitadas por muitas famílias que haviam migrado para a cidade e 'trouxeram' o São João para as ruas onde moravam", pontuou o presidente do Instituto Histórico.
Nos anos de 1980 o governo municipal institucionalizou o São João, promovendo a festa com a colaboração de alguns vereadores, que ajudavam financeiramente os organizadores. Com o tempo, depois de criada a Fundação de Cultura e o Pátio de Eventos Luiz Gonzaga, atual polo principal dos festejos, o São João se tornou a maior manifestação de cultura popular de Caruaru.
"Acho que a ausência dela [da festa de São João] este ano, diante do momento que estamos vivendo, acho que de modo geral, terá maior impacto na economia de Caruaru do que ao sentimento cultural da maioria da população", Josué Euzébio.
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