Raphael Leal com Moraes Moreira, o fotojornalista Evandro Teixeira, a jornalista Silvana Moreira e o cartunista Jaguar
Por Raphael Leal*
Era setembro de 2014. A amiga e colega jornalista, Silvana Moreira, lançava a biografia do excelente fotojornalista Evandro Teixeira, na extinta Livraria Travessa, no shopping Leblon. A noite já estava fantástica, pois fui determinado pelo próprio Evandro para ser o fotógrafo da sessão, com sua câmera Laica.
Vejam, eu fotografava o cara que registrou a ditadura militar, flagrou general de pijama, clicou Senna, Pelé e outros instantes. Logo, a filha dele chegou e assumiu o posto. Fique “livre”, e comecei a tomar um espumante. Chegava gente e a conversa só aumentava com os amigos de Evandro: Sandra do Voley, Jaguar, atores, atrizes, jornalistas, políticos, pintores e músicos. Entre eles, Moraes Moreira. Aí era demais para mim.
Já o tinha visto e assistido aos seus shows quatro vezes. Anos antes, em 2009, durante o Festival Edésio Santos da Canção, em Juazeiro, tive acesso a ele, mas fiquei um tanto receoso de falar com ele e os outros novos baianos. Outra vez, também num setembro, em 2011, estava em Petrolina. À noite, Moraes faria show em um Festival de Arte e Cultura. Após almoçarmos, passamos pela orla de Petrolina e ouvi aquele som...era Moraes “passando” para mais tarde. E paramos, cantamos juntos. Ele perguntou se estava legal. Eu disse que sim, perfeito. Ele confiou no meu ouvido. Passou mais umas duas músicas e saiu do palco. Certamente, deve ter ido contemplar o Velho Chico para se inspirar para o show de logo mais. Que, por sinal, foi sensacional!
Aprendi a gostar de Moraes Moreira em casa. Nem lembro quando ouvi a primeira vez, por ser tão comum no ambiente musical que cresci e foi se fazendo em mim. Mas o tempo é generoso e você vai conhecendo coisas novas, novos sons. O disco Acabou Chorare tinha sumido da minha casa e nunca mais tinha escutado. Em 2003, meu irmão chegou com um CD remasterizado e eu escutava tanto que só faltava “furar” a já obtusa tecnologia de armazenar música. Não sei tocar violão, mas sei ouvir. E escuto bem. E aquele violão de Moraes nas músicas dos “novos baianos” parecia ser o alicerce de toda aquela sonoridade, com uma harmonização perfeita. Era o verdadeiro maestro do bando. Destaco o violão de “Mistério do Planeta” e “A menina dança”. Ninguém faz igual. Nem Davi Moraes.
E assim vamos crescendo, pesquisando. E descubro que Acabou Chorare, segundo eles, só existiu porque João Gilberto visitou a turma e fez a cabeça da galera. E Moraes Moreira era o rockeiro bossa nova do Brasil, com suas melodias cheias de swing, variando entre samba e rock and roll, e encantando todo o Brasil.
Voltando ao setembro de 2014, vejo-o na fila dos autógrafos, com a sua cabeleira encaracolada e chapeuzinho, e os tradicionais óculos escuros. Ali fiquei mapeando os seus passos. Após autógrafo de Silvana e Evandro, ele ficou passeando na livraria e fui logo dizendo. “Oi, Moraes, sou Raphael, lá de Juazeiro”. De imediato, ele me deu atenção e logo perguntou. “Cadê Mauriçola? Está bem? Ali é meu amigo. E Manuquinha? Que figura!”.
Respondi às suas perguntas e a partir daí foram 15 minutos de papo descontraído com um dos meus maiores ídolos. Nas minhas músicas baixadas, há muito de Moraes. Ele desandou a falar de Juazeiro. Galvão sempre trazia os novos baianos para dar um tempo por aqui. Moraes perguntou de João Doido, dos irmãos “Pombos”, Defleur(in) e Luis Bolachinha, e de um bocado de gente. Falava de como era bom caminhar nas ruas de Juazeiro, de ir para a beira do Rio. Eu disse que sentia orgulho quando ouvia “Só se não for brasileiro nesta hora”, mais uma obra de arte da parceria com Galvão.
Também disse que achava melhor o arranjo que ele deu a “Se você pensa”, de Roberto Carlos. Falei que sempre que questionavam o carnaval da Bahia, dizia que o primeiro cantor de trio elétrico tinha sido você. Se os caras desandaram, a culpa não é sua, pois era a grande inspiração.
O baiano de Ituaçu, na Chapada Diamantina, foi de uma gentileza impressionante. Aquele momento já estava mágico demais para durar. Assim, ele apertou minha mão e disse: Valeu, Juazeiro! E se foi.
Encantado com aquele momento, nem me importava mais com o que poderia acontecer naquela noite. No outro dia, só publiquei nossa foto juntos nas redes sociais, e de Moraes e Evandro Teixeira e Silvana. Pouco me importava quem estava lá.
Agora, Moraes vai harmonizar este lugar que ninguém sabe onde é, com seus acordes dissonantes joãogilbertianos, levando todo um legado de alegria, de liberdade. E um pouquinho de Juazeiro vai com ele. É um texto escrito com emoção, mas Acabou Chorare. Vamos cantar, celebrar e agradecer a algum Deus por ter nos dado a honra de estar junto neste mundo e ter tido a oportunidade de escutar Moraes Moreira e o seu violão, um violão brasileiro.
*Raphael Leal é jornalista
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