Roberto Malvezzi (Gogó)
Uma das perplexidades de nosso Brasil atual é a quantidade de pessoas que se dizem cristãs com práticas absolutamente avessas ao que significa ser cristão. Afinal, a síntese última da pertença ao Reino de Deus - ou não - é o que a pessoa faz para quem mais tem necessidades ao longo da vida. O capítulo 25 de São Mateus resume muito bem o que Jesus estabelece para seus seguidores: tive fome e me destes de comer, tive sede e me destes de beber, andava nu e me vestistes, etc.
Oras, se eu devo um copo de água a quem tem sede, como vou ser contra uma política pública que abastece milhões de pessoas com água? Como posso ser contra uma política pública que coloca alimentos na mesa de milhões de pessoas? Se devo cuidar dos doentes, como vou ser contra uma política pública de saúde que cuida de milhões de pessoas que não tem como pagar um médico particular?
Agora, na reforma trabalhista e previdenciária se deu o mesmo fenômeno. Os jornais informam que de 104 deputados da chamada Bancada da Bíblia no Congresso, 100 votaram a favor da reforma da previdência. Acontece que ela retira da mesa dos mais vulneráveis até a migalha que eles precisam para sobreviver, como é o caso do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Aqueles que estão totalmente incapacitados de ganhar seu próprio pão, terão seu benefício reduzido de mil reais para quatrocentos reais. É como se retirassem de Lázaro e do cachorro as migalhas que caiam da mesa dos poderosos. Até isso, até as migalhas disputadas pelos cães...Assim acontece com todos aqueles que se dizem cristãos e votam contra os mais necessitados. Ou não entendem nada de política, ou não entendem nada do Evangelho.
O Evangelho é o amor de Deus para cada criatura, exige amor e solidariedade de cada um de nós para com os outros, particularmente quem está mais vulnerável, o cuidado com todas as criaturas e com nossa Casa Comum, a Terra. Essa espiritualidade exige abertura, solidariedade, fraternidade, justiça, e tantas outras virtudes identificadas como sendo autenticamente cristãs.
Por isso, quando se perde o senso de humanidade, de nada adianta dizer-se cristão.
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