Uma pergunta que o governo alemão e muitos ambientalistas na Alemanha se fazem é o que acontecerá com a cooperação para o desenvolvimento sustentável com o Brasil durante o governo do presidente Jair Bolsonaro. Essa parceria começou depois da Conferência do Clima no Rio de Janeiro, em 1992. Sob a coordenação do então chanceler federal alemão, Helmut Kohl, e do então ministro alemão do Meio Ambiente, Klaus Töpfer, as nações industrializadas iniciaram um programa-piloto para a proteção de florestas tropicais.
De 1992 a 2009, o Ministério alemão da Cooperação Econômica e Desenvolvimento (BMZ) colocou mais de 300 milhões de euros nesse projeto. Além disso, Berlim apoia o Fundo Amazônia, formado por doações para a proteção da floresta. Também o premiado projeto Saúde e Alegria, que promove a saúde e o desenvolvimento sustentável na Amazônia, é apoiado pelo governo alemão, por meio da sua cooperação para o desenvolvimento. Para o coordenador do projeto, Caetano Scannavino, os resultados alcançados estarão em risco se a derrubada de árvores e a mineração forem legalizadas nas áreas de proteção.
"Proteção ambiental não tem nada a ver com romantismo", afirma. "A Amazônia garante o abastecimento de água em todo o Brasil. Quem derruba a floresta para plantar soja prejudica a agricultura no sul do país. Os ministros da Economia e da Agricultura deveriam entender isso", diz.
O analista Thomas Fatheuer, que foi diretor da Fundação Heinrich Böll (ligada ao Partido Verde alemão) no Rio de Janeiro, avalia que uma outra visão predominou durante os governos anteriores. "O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha a seguinte visão: o Brasil é um país de grandes dimensões, há lugar tanto para áreas de proteção da natureza como para a agricultura industrial", comenta.
Já a mensagem de Bolsonaro é outra: precisa-se de mais lugar para o agronegócio. E novo presidente começou a implementar logo essa visão: ele transferiu a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas e o licenciamento ambiental de empreendimentos que podem afetar áreas indígenas do Ministério da Justiça para o Ministério da Agricultura, comandado pelo setor do agronegócio por meio da ministra Tereza Cristina Dias.
Antes disso, Bolsonaro nomeara o advogado Ricardo Salles para o Ministério do Meio Ambiente. Ex-secretário do Meio Ambiente do estado de São Paulo, Salles se tornou, no seu curto mandato, de julho de 2016 a agosto de 2017, alvo de uma ação do Ministério Público por ter alterado ilegalmente o plano de manejo de uma área de proteção ambiental para favorecer setores econômicos.
É hora de acabar com a "indústria da multa" do Ibama, declarou Bolsonaro no Twitter. "Menos de um milhão de pessoas vivem nestes lugares isolados do Brasil de verdade, exploradas e manipuladas por ONGs", acrescentou, sobre os povos indígenas.
Os indígenas responderam com uma carta aberta. Segundo os líderes Marcos Apurinã, Bonifácio José e André Baniwa, o problema não é uma suposta manipulação por ONGs, mas a política ineficiente do governo para os indígenas. "Não aceitamos mais política de integração, política de tutela e não queremos ser dizimados por meios de novas ações de governo", diz a carta. "Queremos continuar sendo indígenas, com direito a nossa identidade étnica."
Exatamente essa exigência está em jogo, pois Bolsonaro vê os indígenas como parceiros de negócios, "um ser humano igualzinho a nós – querem o que nós queremos". Isso inclui ganhar dinheiro, fazer comércio, explorar ouro e madeiras nobres e arrendar terras.
Segundo Fatheuer, que viveu durante 20 anos no Brasil, a legalização da mineração em áreas indígenas será uma das grandes batalhas dos próximos anos. As áreas indígenas representam cerca de 13% do território brasileiro e são propriedade do Estado, que concede o usufruto das terras aos indígenas e, em troca, espera uma contribuição para a proteção da natureza. A mineração só pode ser feita nessas áreas com autorização do Congresso e concordância das comunidades que nelas vivem.
Desde 2004, a demarcação de terras indígenas e áreas de proteção ambiental contribuiu para desacelerar o desmatamento na região da Floresta Amazônica. Segundo o Inpe, a taxa recuou de 25 mil quilômetros quadrados ao ano para 5 mil em 2014. Desde então, queimadas e derrubada de árvores voltaram a crescer. Em 2018, cerca de 7.900 quilômetros quadrados de floresta tropical podem ter sido destruídos. "Houve muitos avanços na proteção da floresta tropical", comenta Fatheuer. Por isso, diz, também há muito a perder.
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