Nos próximos 100 anos, a paisagem da Terra pode se tornar irreconhecível. A menos que a emissão de gases de efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento do planeta, não sofra reduções dramáticas, mais de 60% da vegetação ficará muito diferente do que se conhece hoje, alerta um grupo internacional de pesquisadores liderados pelo Serviço Geológico dos Estados Unidos. Baseados em registros climáticos do fim da era do gelo, há 21 mil anos, eles concluíram que os ecossistemas mundiais deverão sofrer impactos maiores do que se imagina.
Para chegar a essa conclusão, os cientistas analisaram registros fósseis vegetais em 594 regiões de todos os continentes, exceto a Antártida, referentes à última deglaciação, um período de aquecimento natural que começou 21 séculos atrás, colocando fim à última era do gelo. Modelos climáticos mostram que, na ocasião, a temperatura da Terra aumentou de quatro a sete graus Celsius, comparável ao que se espera ocorrer nos próximos 100 a 150 anos caso não se tome medidas drásticas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Os principais responsáveis pelo fenômeno hoje são os combustíveis fósseis, que lideram a matriz energética de quase todos os países.
Em um artigo publicado na revista Science, os autores do trabalho destacaram que são esperadas alterações tão profundas na paisagem da Terra quanto as ocorridas no fim do último glacial, pois o aumento de temperatura será semelhante. Há, porém, uma diferença fundamental. Enquanto o fenômeno natural levou 21 mil anos para ocorrer, no presente, bastarão dois séculos para que algo parecido aconteça no planeta. “Nós descobrimos que, como consequência da deglaciação, os ecossistemas por todo o mundo passaram por grandes mudanças. Cerca de 70% deles foram afetados com imensas alterações nas espécies que abrigavam e no tipo de vegetação”, observa Connor Nolan, candidato ao doutorado no Departamento de Geociências da Universidade do Arizona e um dos autores do estudo.
De acordo com o artigo, assinado por 42 pesquisadores, as mudanças nos ecossistemas vão ameaçar a biodiversidade global, interferindo diretamente nos serviços naturais vitais à humanidade, incluindo o estoque de carbono e a disponibilidade de água potável.
“Se permitirmos que as mudanças climáticas aconteçam sem interferências, a vegetação desse planeta será completamente diferente do que é hoje em 100 anos, o que significa um risco enorme à diversidade da Terra”, observa Jonathan Overpeck, reitor da Faculdade de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Universidade de Michigan e coautor do trabalho.
O pesquisador observa que os registros fósseis indicam que as regiões mundiais com maior crescimento de temperatura desde o fim da era do gelo foram as que passaram por maiores alterações da vegetação. Regiões em latitudes médias a altas da América do Sul, da América do Norte e da Europa tinham a maior cobertura de gelo há 20 séculos e, consequentemente, foram as que mais aqueceram desde então. Nesses locais, as mudanças drásticas no ecossistema chegaram a atingir 67% da vegetação. Vinte e seis por cento da cobertura vegetal foi afetada moderadamente.
Caso o cenário de emissões não seja modificado, os pesquisadores calculam que mudanças em larga escala na vegetação do planeta ultrapassem 60%. Porém, se o Acordo de Paris, assinado em 2015, for colocado em prática, com reduções que garantam aumento de temperatura menor que 2ºC até o fim do século, a cobertura vegetal ainda assim sofrerá alteração, mas em um percentual menor: 45%.
“Grande parte das mudanças pode ocorrer durante o século 21, especialmente quando outros fatores amplificam as perturbações nos ecossistemas, como extremos climáticos, desmatamento, fragmentação de habitats, espécies invasoras e extração exagerada de recursos naturais”, escreveram os pesquisadores.
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