ARTIGO – VAQUINHAPRANÓS.COM

20 de May / 2018 às 23h00 | Espaço do Leitor

Nos tempos nebulosos do Brasil da atualidade, a linguagem da seriedade e integridade nas negociações tristemente foi substituída por práticas pouco ortodoxas de gestão, e o sentimento espúrio do “toma lá, dá cá” parece ter se tornado regra imperativa nos contratos das obras públicas, com estabelecimento até mesmo de comissões percentuais sobre os valores liberados, como era praticado pelo Sérgio Cabral quando governador do Rio de Janeiro.

Naturalmente que toda essa sujeira predominante, inicialmente se configurava no apoio financeiro para as campanhas eleitorais com recursos oficialmente reconhecidos e legalizados, mas cresceu tanto que o excedente recebeu o apelido de CAIXA 2. E aí o volume de dinheiro foi tão expressivo que deixou de ter uma finalidade apenas eleitoral para ter um objetivo de duplo sentido, ou seja, promover, também, o enriquecimento ilícito pessoal de toda uma quadrilha envolvida, desde o cabeça principal, os seus familiares, assessores e até os chamados “mulas” que se encarregam de transportar as malas com milhões de reais! No início, ainda primários nesse tipo de crime, usavam até a cueca para transportar o dinheiro. Hoje, além das malas, o “propinoduto” já abre várias contas nos paraísos fiscais através da importante figura do “doleiro”. Nesse particular, e para provar a tese de que “baiano não nasce, estreia”, aqui a corrupção foi mais criativa e avançou no tempo ao escolher colocar milhões de reais e dólares numa sala de apartamento, cujo uso era especificamente para esconder Dona Dinheirama! Tem exemplo de crime com maior sofisticação do que esse?

No meu parco entendimento, confesso que não encontro onde está a razoabilidade da mudança da lei para excluir o apoio financeiro da pessoa jurídica para as campanhas eleitorais! Alguém nesse país, de sã consciência, acredita que os gastos dos candidatos e partidos nas futuras eleições estarão restritos às doações das pessoas físicas? Logo o cidadão que batalha diuturnamente para prover o sustento da família, desde o que ganha o sofrido salário mínimo àquele com maior nível de rendimento, mas que paga uma fortuna pela escola dos filhos ou o preço exorbitante do Plano de Saúde, irá mesmo se dispor a doar algum valor para essas campanhas? Isso é uma verdadeira piada, só sendo...!

Apesar da boa intenção de purificar o sujo sistema político nacional, acho que é brincar com a inteligência do brasileiro em admitir que as empresas irão ficar mesmo de fora desse financiamento, quando me parece que agora sim, o CAIXA 2 foi simplesmente promovido a CAIXA 1, e agora os partidos e os candidatos vão ter mais trabalho para fazer o controle das duas verbas: as “eventuais” doações legais da pessoa física e as ilegais da pessoa jurídica que trabalhará sutilmente nos bastidores. E ainda afirmo mais: irão utilizar fartamente a pessoa física como “laranja” para legalizar parte das doações oriundas das empresas! Ora, as empresas não vão deixar escapar esse forte poder de barganha para os seus futuros negócios com os governos, que é ajudar financeiramente os candidatos durante as suas campanhas.

Sabe-se que nos EUA há um engajamento histórico do eleitorado na contribuição financeira para a campanha do seu partido, por uma questão cultural. Aqui já se tem o hábito quase rotineiro de se fazer uma “vaquinha”, mas para ajudar alguém necessitado, seja por motivo de saúde, para comprar um medicamento, ajudar na reforma de um casebre, etc. É um ato de solidariedade humana. Mas, numa fase de quase total falta de credibilidade dos políticos brasileiros em geral, será uma missão quase que inglória esperar esse gesto espontâneo do eleitor, que logo imaginará que a sua sofrida contribuição para essa “vaquinha” poderá ter destinos os mais diversos!

O grau da competição já é intenso para conquistar o mercado da “vaquinha online”, com a participação de inúmeras empresas cadastradas pelo Tribunal Eleitoral, visto que a arrecadação já se iniciou desde o último dia 15 de maio. Embora a situação tenha um enfoque sério e legal, não tenho dúvidas que vai se popularizar o hábito nefasto da “vaquinhapranos.com”!

Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público - Aposentado do Banco do Brasil – Salvador - BA.

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