O Sistema Interligado Nacional (SIN), basicamente hidroelétrico, contém a segunda capacidade de armazenamento de água do planeta. Só perdendo a liderança para o Canadá, que tem a desvantagem de operar sem um sistema interligado. Apesar disso, o SIN sobrevive, hoje, de sobressaltos em função da situação climática. Este mês começa o chamado período seco, sem chuvas, que vai até novembro. Mas não há certeza do índice pluviométrico com o qual o país viverá até lá.
No Sudeste, onde estão alocadas 70% das reservas de água, o volume dos reservatórios atingiu 40%. Há um ano, o patamar era o mesmo. E São Pedro deu uma ajuda: choveu muito até junho, avançando pelo período seco. Com isso, a primeira bandeira tarifária que apareceu na conta do consumidor, sinalizando a subida do custo da produção de energia. Tais medidas paliativas são chamadas de “esparadrapos”, por Renato Queiroz, pesquisador do Grupo de Economia de Energia da UFRJ e diretor do Instituto Ilumina. Segundo ele, a gestão do SIN precisa mudar para enfrentar as mudanças tecnológicas do mundo contemporâneo. E essas mudanças não serão feitas com implemento de tarifas.
“Este ano os reservatórios estão um pouco melhor. Hoje, com a afluência de chuva na região do rio São Francisco, está com cerca de 34%. Melhorou, mas estamos com as barbas de molho. Tecnicamente, se parar de chover, a situação complica. Mas acho que não teremos racionamento até as eleições”.
O pesquisador lembra que o momento político, com as eleições, pode não ser um bom período para disparar uma bandeira vermelha na conta de luz. E arrisca afirmando que “se vier um aumento da energia elétrica, deverá ser no final do ano”.
“No Brasil, a geração solar, por exemplo, ainda está devagar porque é muito cara, com equipamentos importados. O consumo médio de energia do brasileiro é 160 kWh. Uma placa fotovoltaica de 2 m² tem capacidade de gerar 40kWh/mês. Uma casa simples, com 10m², uma TV e uma geladeira funcionando, consome, em média, 220 kWh/mês. Um programa consistente que proporcionasse condições para instalações de placas de até 220m², com investimento razoável, iria aliviar o sistema interligado e, consequentemente, reduzir a conta de luz do consumidor”.
O especialista também cita o uso do biogás, das florestas energéticas e as campanhas, especialmente as dirigidas para processos industrias eficientes, como fundamentais para reorganizar o planejamento energético brasileiro. E acrescenta que o enorme fator de capacidade da energia nuclear não deve ser esquecido. “É cara, é polêmica mas não depende do clima. O Brasil é o sexto produtor mundial de urânio, o combustível nuclear, temos o know how da indústria e não é poluente. Precisamos da nuclear no mix energético”.
A emissão de gases poluentes é um dos grandes desafios do produtor de energia, no mundo tecnológico. Mas até o uso das energias renováveis necessitam de óleo para ser disparado. Para isso estão sendo desenvolvidas baterias solares potentes. “Se implantarmos um sistema nacional de geração de energia solar, vamos precisar ter um backup para quando não tiver sol. Com a energia eólica acontecerá o mesmo. No Brasil, temos um diferencial: os reservatórios, a nossa joia da Coroa. Eles, nesse caso, serão a alternativa e serão usados”.
A capacidade desses reservatórios está diminuindo. “Em 2012 podíamos acondicionar volumes d’água por cinco meses. Hoje, essa reserva só é possível por dois meses. Não podemos construir mais reservatórios porque teremos problemas com o meio ambiente. As usinas, a fio d água, que estão sendo implantadas, não acumulam tanta água”.
O novo papel dos reservatórios, “não é mais função dessas caixas d’água servirem como geração de base. O correto seria guardarmos a água nos reservatórios e começarmos, aos poucos, a implantar energias sustentáveis. No Brasil, quando chove menos venta mais e vice-versa. Aqui as eólicas geram de 45% a 50% do ano. Na Europa, somente 25%”. Esses reservatório teriam baterias para entrarem em operação na hora em que faltar o vento para gerar energia”.
O diretor do Ilumina conclui afirmando que, para irmos ao encontro desse futuro setor elétrico, a base teria que ser com segurança energética e cuidados com o meio ambiente. “O cerne do planejamento seria os reservatórios terem outra função: de backup, ficando sob a gestão do governo e não com o setor privado”.
Uma nova gestão desse rico manancial, gerador de energia para o país, de modo que o sistema elétrico não dependa das chuvas, tem sido foco dos estudos de especialistas, como o pesquisador Renato Queiroz. “O modelo elétrico brasileiro abriu o mercado a partir dos anos 90. Em 1995 houve um incremento de tecnologias caras. Foram instaladas térmicas para serem usadas como backup das usinas hidráulicas, em caso de falta de chuvas. Começaram os problemas com o custo e os acertos do aumento da tarifa foram sendo feitos. São os ‘esparadrapos’, que precisam ser retirados”.
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