Eu preciso escrever!
Esta frase já estava na minha programação de hoje, porque o dia eu reservei pra avançar na escrita da minha dissertação de mestrado. Mas eu já fiz também tantas outras coisas hoje, que a gente fica até tentada a cair naquele velho golpe machista de que "mulher consegue fazer várias coisas ao mesmo tempo". Bom, decidi continuar a escrever, só que agora vou falar sobre angústia, dor, revolta e força.
Uma página de um diário? Talvez. Na minha adolescência fiz muito isso quando tinha alegria, tristeza, indignação... escrever, desabafar no papel sempre foi e é para mim uma terapia, ainda que seja somente eu mesma a leitora. Mas essas palavras de hoje eu quero compartilhar.
O Brasil assiste a mais um assassinato de uma militante. Já foram muitas mulheres, muitos homens, jovens, na luta por elementos tão básicos como terra, moradia, água, diversidade, respeito. Marielle Franco foi mais uma! Uma mulher que até ontem à noite eu nunca tinha ouvido falar. Eu, assim como milhões de brasileiras e brasileiros, não sabia nada sobre sua história. Era uma voz ativa, forte, porém silenciada pela mídia nacional, da mesma forma que silencia tantas outras vozes, especialmente de mulheres, negras, da favela, mulheres da política e das lutas, mulheres combatentes em um sistema extrema e dolorosamente opressor.
A morte desta mulher está doendo, um aperto no peito como se a conhecesse de algum lugar, como se fosse uma companheira aqui dos movimentos locais. Tantas companheiras aqui perto com histórias de vida tão semelhantes à dela, deve ser por isso.
Ela era um pouquinho de cada uma de nós. Seja pela cor da pele, seja por ter origem na periferia, seja por ter sido mãe aos 17 anos, seja por ter ingressado nas lutas sociais, seja por ter feito cursinho pré-vestibular comunitário, ter cursado uma graduação com bolsa – porque as Universidades Públicas, assim como as privadas, não "cabe todo mundo" –, por ter feito um mestrado, ter colocado a academia como espaço também de disputa, empoderamento e briga por direitos. Seja ainda por ela ter ocupado espaços importantes de poder!
Recai sobre nós um sentimento de impotência. Sabemos que não temos a quem recorrer, porque a (in)justiça é a principal suspeita. Bate o medo de que a intervenção militar – que já acontece todos os dias em nossos bairros e comunidades rurais – tome conta do país da forma como está acontecendo no Rio de Janeiro. Sim, podemos morrer combatendo o exército que venha nos calar, porque não vamos calar.
O grito preso na garganta é aquele que chamaria de covarde quem agiu com tanto ódio na noite deste dia 14 de março. Março, justo março. Dia 14, dia da poesia. Março, mulher, luta e poesia. É tanta coincidência, tanto quanto a equação: vereadora militante, denúncias, polícia, assassinada. É revoltante e é triste porque qualquer grito ecoado não trará a vida de ninguém que foi derrubado pela violência brutal das elites hipócritas deste país. Sim! E hipocrisia define o pronunciamento do presidente golpista Michel Temer sobre o caso. Ele, justo ele, que ajudou a orquestrar todo esse caos que o Rio de Janeiro vive nesses últimos tempos, dando uma amostra do terror para todo país.
Marielle foi mais uma que se foi porque defendia os Direitos Humanos. O Brasil é o país das Américas que mais mata defensores/as dos Direitos Humanos, diz a relatório da Anistia Internacional. Esse dado não representa nada para quem não sabe o que é Direitos Humanos. Mas é assustador, é inaceitável para quem sabe, para quem levanta essa bandeira por mim, por você, por nós.
2018 está apenas (já) no seu terceiro mês. O mês em que a história nos conta que mais de 100 mulheres fizeram greves, morreram queimadas em uma fábrica... o mês em que se celebra toda a luta por igualdade de gênero. Nos resta então nos apegar a bravura e força da nossa ancestralidade e buscar na natureza a resistência necessária para vibrar positividade, para erguer o punho com mais firmeza, puxar o grito de ordem e seguir em marcha segura, com braços entrelaçados, para não perdemos mais nenhuma companheira, nenhum companheiro.
Apesar de tudo, com os que riem de tudo isso compartilho: A luta é como um círculo, pode começar em qualquer ponto, mas não termina nunca.
Por Borboleta da Caatinga (pseudônimo)
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