Ensino Médio noturno é essencial para que jovens possam se manter no estudo

A reforma do Ensino Médio segue gerando discussões. O tema de agora é o ensino noturno, que a princípio seria abolido, mas, após uma “reforma da reforma”, foi mantido. Daniel Cara, da Faculdade de Educação da USP, diz que o oferecimento do Ensino Médio noturno é essencial para a realidade brasileira e aboli-lo causaria consequências sérias para a educação nacional.

“O Ensino Médio noturno sempre foi imprescindível para a garantia do direito de educação. A realidade é que a maior parte dos estudantes de periferia, a partir dos 16 anos, sonha em encontrar um lugar no mercado de trabalho. O Ensino Médio noturno cumpre a tarefa de garantir tanto a conclusão da educação básica quanto o ingresso no mercado de trabalho”, afirma ele.

A medida de 2017, que acabava com o Ensino Médio noturno, se deu de uma maneira “extremamente insensível”. De acordo com o professor, é fato que as aulas à noite têm vários problemas, como o cansaço dos alunos e do próprio docente, mas a situação em que muitos jovens se encontram faz disso o menor dos problemas.

Questões de pobreza, dificuldade de acesso a uma renda digna e problemas familiares são alguns fatores que impedem o cenário ideal de que o jovem precisa apenas estudar. Na prática, se eles precisarem escolher entre estudo e trabalho, optarão pela renda por uma questão de sobrevivência. Mas o Ensino Médio noturno faz justamente essa concessão de oferecer mais oportunidades para os menos privilegiados.

Daniel Cara inclusive lembra de sua própria experiência como exemplo: “Eu fui aluno de escola técnica estadual, e o último ano do meu curso era noturno, o que era necessário para fazermos o estágio. Então, foi uma fase importantíssima da minha vida”.

Porém, a situação atual, segundo o professor, ainda não está solucionada. Para ele, a reversão da medida foi positiva, mas insuficiente. Daniel Cara argumenta que o oferecimento das aulas no noturno, segundo previsto, será limitada, e que não dará conta da grande demanda. Em consequência disso, ele se diz “muito preocupado com os dados educacionais que vão surgir a partir do ano que vem”.

Isso porque, se não conseguirem vagas no período noturno, “muitos estudantes simplesmente vão abandonar a escola pelo fato de que, no seu município, eles não vão encontrar o Ensino Médio noturno”, prevê o educador. De acordo com ele, o oferecimento das aulas deveria seguir a lógica da demanda, acompanhando as necessidades dos alunos.

Além disso, o professor afirma que, para além das aulas, são necessárias políticas públicas e sociais que possibilitem que os jovens sigam estudando. Mesmo que muitos estudantes tenham fontes de renda, estas muitas vezes são insuficientes para que eles tenham condições razoáveis de se manterem e poderem dar atenção aos estudos.

Daniel Cara, que também participa de discussões nacionais sobre o tema, afirma ter sido consultado pelo Ministério da Fazendo sobre uma possível bolsa-auxílio a jovens pobres do Ensino Médio que precisem de ajuda. Segundo ele, é “muito provável que seja criado um programa de permanência dos estudantes, uma espécie de bolsa para o Ensino Médio noturno, inclusive somando a própria renda que os alunos conseguem obter no mercado de trabalho”. A informação, no entanto, é uma previsão, não uma certeza confirmada.

Jornal da USP