“A sensação é de que o futuro já está aqui”. O comentário é da jornalista Giovana Girardi, durante o seminários da terceira edição do USP Pensa Brasil.
Além de Girardi, Paulo Artaxo, cientista e Professor Sênior no Instituto de Física da USP; Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima; Eduardo Costa Taveira, secretário de Estado do Meio Ambiente do Amazonas; e Tainá de Paula, vereadora pelo PT no Rio de Janeiro e secretária de Ambiente e Clima do mesmo município, completaram a roda de debate sobre mudanças climáticas sediada no Auditório Istvan Jancsó.
Abrindo as apresentações, Artaxo começou abordando os dados mais recentes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), ressaltando que “mudança climática não é só temperatura”. Caso não haja mudança nas emissões de gases estufa atuais, os eventos climáticos extremos, como furacões, inundações e secas, continuarão aumentando em intensidade e frequência e a temperatura média mundial pode aumentar em até 4,3 °C, completou ele.
Além disso, segundo Artaxo, as mudanças climáticas apontam para uma perda drástica de biodiversidade e aumento de riscos para a saúde humana. No Brasil, na visão dele, os níveis pluviométricos devem aumentar no Sul, como visto pelas chuvas do Rio Grande do Sul, enquanto no Nordeste, o clima semiárido pode se tornar árido, assim, certos lugares se tornam inóspitos. Já a Amazônia está próxima de uma transição crítica, na qual, mesmo com o Brasil zerando a emissão de gases poluentes, a degradação da floresta ainda agravaria o efeito estufa. Há saída para a situação e “a COP-30 certamente vai ser uma das últimas oportunidades para aumentar a resiliência de nosso planeta e evitar enormes impactos socioeconômicos”.
Em seguida, Márcio Astrini abordou justamente as questões sociais das mudanças climáticas. Na sua visão, os efeitos dessas mudanças, como as enchentes no Paquistão em 2022 e no Rio Grande do Sul ainda este ano, vão “ganhando mais espaço no nosso incômodo”. Ou seja, para ele, a percepção popular vai se intensificando.
Astrini também pontuou que, apesar da maioria da população reconhecer o efeito estufa como realidade, a média mundial de pessoas que consideram mudanças climáticas como questão de primeira importância é de apenas 14%. Para Astrini, as pessoas mais afetadas por essas mudanças já enfrentam a desigualdade social, a pobreza extrema hoje. “A pessoa precisa sobreviver nesta semana, ela não está pensando daqui a dez anos.” Portanto, “a agenda de clima não precisa ser popular para ser tratada com responsabilidade” pelos governantes.
Eduardo Costa Taveira seguiu o tema da percepção cidadã ao tratar em específico da região Amazônica. Segundo Taveira, “muitas vezes, a perspectiva de soluções que se tem para a Amazônia é colonialista”, porque, para ele, normalmente ela tende a excluir a voz dos povos que de fato vivem naquela região, além de que essas soluções frequentemente são criadas muito distantes do bioma. “A Amazônia real não é vista da copa da árvore numa imagem do Google”, assim ele vê como necessária a inclusão dos discursos dessas populações para se encontrar uma saída para os problemas climáticos da Amazônia.
Finalmente, Tainá de Paula deu segmento ao foco socioeconômico da fala de Taveira. De acordo com a vereadora, “é muito estratégico, nós, da pauta climática, tirarmos ganchos que enraízam a realidade do povo”. Assim, acrescenta, “nós vamos ter que construir pactos sociais novos. A crise ambiental climática antecipa a nossa crise social aguda”. Por exemplo, no ano passado, uma fã da cantora Taylor Swift faleceu por estresse térmico à espera do show da artista no Rio de Janeiro. A partir dessa tragédia, foi possível “consolidar um protocolo de enfrentamento ao calor extremo” que chegou a conscientizar boa parte da população.
No final do seminário, os convidados pautaram suas esperanças a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP 30), que será realizada ano que vem em Belém (PA). Artaxo espera que dois temas sejam fundamentais: o financiamento climático e a renovação das metas de redução dos gases de efeito estufa. Já Astrini afirmou que “conferência de clima não faz milagre”, portanto, mais importante que as duas semanas de discussão da COP é o que será feito pelos países durante as outras cinquenta semanas do ano.
Jornal da USP
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