Hoje em dia, é comum manter um perfil e acessar as redes sociais, pelo celular ou pelo computador, seja para entretenimento ou busca de conhecimento e informação. No entanto, para quase 46 milhões de brasileiros, declarados com pelo menos uma deficiência no Censo Demográfico 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esse acesso não é tão fácil.
Portadora de baixa visão, a jornalista Mariana Rosa conta que tem dificuldades com o Instagram e o Tik Tok, por exemplo, por serem “redes muito apoiadas na visão”, que não oferecem recursos tão eficazes à sua deficiência.
Os leitores de tela desses aplicativos “às vezes, pulam muito”, afirma, alertando sobre a necessidade de maior investimento no programa para o uso de tais ferramentas. A jornalista cita também a falta de audiodescrição e legendas em vídeos como recursos que “auxiliam bastante”.
Pouca acessibilidade digital aumenta discriminação para pessoas com deficiência
Embora veja melhorias na acessibilidade digital ao longo dos últimos anos, Mariana, que é ativista dos direitos das pessoas com deficiências, diz notar a discriminação desse segmento da população nas redes sociais. A maior acessibilização, para a jornalista, deve partir dos próprios criadores das redes e, para tal, considera necessária maior compreensão e conscientização da sociedade quanto à utilização igualitária dos espaços por todos.
O que é acessibilidade digital? Trata-se de um conjunto de recursos que minimizam “barreiras encontradas por pessoas com deficiência no acesso à informação e na participação em processos e meios de comunicação digital”, afirma Biancha Angelucci, professora do Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação da Faculdade de Educação (FE) da Universidade de São Paulo. E a participação ativa de pessoas com deficiência em todas as áreas, inclusive nas redes sociais, lembra a professora, não apenas garante seus direitos políticos, mas amplia “a experiência humana”, com o enriquecimento mútuo de diferentes pessoas e percepções ao andar juntas.
Ao contrário do ideal, diz a especialista da USP, a situação atual é de pouca acessibilidade digital, o que aumenta o preconceito e a discriminação, diminuindo a pluralidade das formas de comunicação e o entendimento de diferentes realidades e leituras de mundo. Para Biancha, distantes de códigos, línguas e modalidades de comunicação restritas àqueles com deficiência, as outras pessoas não conseguem enxergar além.
De acordo com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, trabalha-se a acessibilidade a partir da identificação e eliminação de obstáculos e barreiras para essas pessoas. Os meios de comunicação, segundo Biancha, também devem compreender impedimentos à participação e acesso à informação de pessoas com deficiência, considerando, inclusive, que “pessoas com a mesma deficiência podem viver barreiras diferentes”, ao mesmo tempo em que, “pessoas com deficiências distintas podem enfrentar uma mesma barreira”, comenta a professora.
Com a audiodescrição (descrição de imagens por meio de áudio), por exemplo, conteúdos em imagens tornam-se acessíveis para pessoas com deficiência visual e para indivíduos com transtornos mentais, “que podem enfrentar dificuldades de leitura de símbolos”. Já a legendagem é útil para pessoas surdas sinalizantes (que utilizam a Língua Brasileira de Sinais), pessoas com deficiência auditiva oralizadas (que utilizam a língua oral, leitura de lábios ou escrita) e também ao deficiente intelectual.
Para conteúdos de áudio, a orientação é que seja utilizada fala mais lenta, evitando várias falas ao mesmo tempo. Em “cards”, é preciso evitar “texto sobre imagem, com cores de pouco contraste ou com letras de formato muito poluído”, explica Biancha. Outro recurso lembrado pela professora é o da veiculação do mesmo conteúdo em várias modalidades de comunicação para que seja acessível a diferentes públicos.
Para superar a segregação vivida por este segmento da população, a professora acredita que a conscientização sobre a importância da acessibilidade digital possa incluir “políticas de comunicação” que promovam “participação direta” de pessoas com deficiências. O que, segundo ela, abre espaço para que essas pessoas participem de discussões que vão além de suas próprias questões e alcancem o esporte, a saúde, a cultura, a política, a economia e a educação, ocupando espaço em todas as plataformas.
Biancha defende ainda a participação e contratação de pessoas com deficiência em ambientes virtuais, incorporando intérpretes de libras às rotinas da produção em vídeos, utilizando plataformas que geram legendagem automática e proporcionando cursos de audiodescrição aos trabalhadores do meio digital. Estas são ações fundamentais para a acessibilização, segundo a professora.
Jornal da USP
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