A taxa de transmissão de Covid-19 no Brasil está abaixo de 1, isso significa que o contágio vai diminuindo, o que é fundamental, afirma especialista

Desde o registro da primeira morte pela Covid no país, em março, o Brasil tem percorrido um caminho diferente do observado em outras regiões do planeta, como na Europa, por exemplo. Lá, houve um pico de casos, seguido de uma queda. Aqui, foram meses naquilo que os cientistas chamam de platô, com alto número de mortes. O Jornal Nacional ouviu pesquisadores sobre o momento que nós estamos atravessando agora na pandemia.

Um país enorme, muito desigual e que reagiu de maneiras diferentes à pandemia. Tudo isso fez com que, no lugar de um pico com queda rápida, vivêssemos a longa agonia do platô, ou seja, números altos e persistentes de doentes e mortes.

“Por que que durou tanto? Porque, primeiro lugar, isolamento social, por mais que tenha sido sabotado, não cumprido em algumas situações, ele funcionou. Ele não deixou que o número de casos, na média, fosse muito, muito alto, como foi observado em alguns países. Segundo passo é que, à medida em que melhorava em algumas capitais, melhorava em Manaus, melhorava em São Paulo, e a média tenderia a diminuir, ela foi aumentando em outras capitais. Ela foi aumentando em Belo Horizonte, Goiânia, Porto Alegre. Então, um número foi se somando a outro e fez com que, do ponto de vista nacional, a gente tivesse uma duração do platô maior”, explica Renato Grinbaum, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia.

Platô que, nos últimos dias, começou a declinar depois que a Covid-19 se espalhou realmente por todo o país.

“O padrão é muito diferente. O famoso platô do Brasil era a soma da descida em alguns lugares e da subida de outros lugares. Nunca existiu uma estabilidade para o país”, destaca Paulo Lotufo, professor de epidemiologia da USP.

No final de julho, com o vírus disseminado, o Brasil chegou a ter 12 estados com o número de mortes aumentando. Neste domingo (6), foi a primeira vez que tivemos apenas um estado com alta na média móvel de mortes. Na segunda-feira, 7 de setembro, eram dois estados em alta, mas, na terça (8), quarta (9) e quinta (10), apenas um. Agora, a maior parte do país vê o número de mortes em estabilidade ou em queda.

No feriado, o Brasil teve, pela primeira vez, desde que começamos a calcular a média móvel, o maior número de estados com queda na média de mortes: foram 17. No dia seguinte, foram 19 com redução de óbitos. Na quarta, 17 de novo, e na quinta, 16 estados com redução.

“Está diminuindo, isso é uma boa notícia, deve ser comemorado, mas com o cuidado de lembrar que cada estado é diferente. Então avaliar os dados por região e até redobrar os cuidados com as medidas de prevenção, porque a gente está passando por um período de reabertura, e essa reabertura tem que ser feita com a maior cautela possível” avalia Natália Pasternak, microbiologista e pesquisadora da USP.

São atitudes importantes para que os números continuem caindo como agora e se distanciando dos piores momentos.

No dia 4 de junho, passamos pela primeira vez de mil mortos por dia. O Brasil manteve esse média terrível por um mês inteiro. Desde o feriado de 7 de Setembro, a média móvel começou a cair e ficou abaixo de 800.

Mas os médicos e cientistas que analisam o comportamento da pandemia lembram que esses números falam do passado porque os registros de mortes demoram dias para ser feitos.

Já o futuro depende das ações do poder público e do comportamento, da disciplina da população. O feriado que trouxe esses números de certo alívio também é visto com preocupação. “Nós conclamamos e continuamos a dizer isso, é que a pessoas se comportem se protegendo e protegendo aqueles que elas gostam. O momento ainda pede prudência, muita prudência, um comportamento solidário entre as pessoas. Então ver aglomeração hoje é algo que nos entristece muito e nos preocupa”, diz Margareth Dalcolmo, médica e pesquisadora da Fiocruz.

A pneumologista da Fiocruz, no Rio de Janeiro, explica que, para acelerar a contenção da pandemia, é preciso investir em testes, isolamento de cada novo caso e monitoramento dos contatos.

“Nós estamos fazendo projetos dessa natureza aqui, em áreas de comunidades muito carentes. Cada caso diagnosticado por nós gera no mínimo quatro contatos que são testados também, que são familiares ou pessoas que estão muito próximas”, explica Margareth Dalcolmo.

Os especialistas lembram que, entre os mais de 210 milhões de habitantes, ainda é imenso o número de pessoas que não têm anticorpos.

“Nós temos ainda uma porcentagem de pessoas que tiveram contato com o vírus ainda pequena. Ela varia de 18% em estados do Sudeste até 38% nos estados do Norte. Nós estamos em um momento de respiro e o meu otimismo depende do tanto que a população aderir às medidas de prevenção”, afirma Renato Grinbaum.

Outra boa notícia é que a taxa de transmissão no Brasil está abaixo de 1. Isso significa, por exemplo, que uma centena de pessoas transmite para menos de 100, e assim o contágio vai diminuindo, o que é fundamental.

“A gente tem que encarar essas boas notícias com otimismo, sim, com esperança, mas com cautela e responsabilidade, porque ainda não acabou. E cabe a nós fazer com que essa taxa de transmissão caia ainda mais. Não precisa só ser a história natural da doença, pode ter a nossa participação efetiva, como sociedade colaborando com as medidas de contenção para que essa taxa caia mais rapidamente e a gente saia antes, quanto antes o possível, dessa situação”, afirma Natália Pasternak.

JN